INTEGRACIÓN Y CONOCIMIENTO

N° 4

 

ISSN 2347 - 0658

Año 2016

 

 

“Las universidades en el Reino Unido están cada vez más al

servicio de la economía neoliberal, en nombre del bien público”.

ROBERT COWEN

Professor Robert Cowen es Profesor Emérito del Instituto de Educación de la Universidad de Londres (IOE). Fue Presidente de la Sociedad Europea de Educación Comparada. Investigador Senior de la Universidade de Oxford. Profesor Visitante de las Universidades de Brasilia, Católica de Lovaina (Bélgica) y University of La Trobe en Melbourne (Australia). Miembro del Consejo Editorial de Comparative Education Review. Ha publicado números artículos en revistas científicas y libros, entre los que se destaca International Handbook of Comparative Education, obra de referencia internacional organizada conjuntamente con Andreas Kazamias e Elaine Unterhalter.

111

Entrevistador: Célio Da Cunha

Entrevista

Célio da Cunha (CC): A tese da Universidade como um bem público foi objeto de muitas polêmicas durante a Conferência de Paris, de 1998. Como o senhor analisa a polêmica entre universidade, como bem público versus universidade orientando-se pelas demandas de mercado?

Robert Cowen (RC): O enfoque mais sutil e arguto a esta questão é perguntar quem define o bem público, em quais períodos de tempo e em que locais. Na União Soviética, após 1917, depois da luta entre os Vermelhos e os Brancos, a universidade deveria servir ao bem público, excluindo as crianças oriundas da classe média alta e das famílias aristocráticas e, mais tarde, na medida em que o ensino superior evoluía, o “bem público” deveria ser caracterizado pelo encorajamento da pesquisa e teses de doutorado com a finalidade de solucionar problemas práticos (como uma contribuição ao desenvolvimento da União Soviética).

INTEGRACIÓN Y CONOCIMIENTO

N° 4

 

ISSN 2347 - 0658

Año 2016

Nos dias atuais, em um forte sistema de monitoramento administrativo, a definição do “bem público” nas universidades britânicas é medida em termos de sua qualidade (em ciclos de, aproximadamente, cinco ou seis anos). A mais recente definição de “qualidade” inclui a necessidade segundo a qual todos os acadêmicos devem definir o impacto social e econômico de sua pesquisa.

No Reino Unido, a distinção entre as universidades e o setor público assim como entre as universidades e o setor privado, é irrelevante - há apenas uma universidade privada. Neste contexto, todas as universidades do Reino Unido tornam-se cada vez mais subordinadas ao serviço da economia neoliberal - em nome do “bem público”. Essa política de visão e de reforma legitimiza-se pela definição de “globalização” como um fenômeno primordialmente econômico; a adaptação à globalização determinará a sobrevivência e sucesso relativo das nações dentro da ordem mundial. A consequência é a redefinição intencional da universidade no marco da economia, passando a ser subordinada às demandas do mundo econômico, com uma diminuição um tanto quanto sem critério dos seus papéis cultural, politico e social de significado histórico.

CC:A Conferência de Paris de 1998, em sua Declaração final, incluiu a necessidade de diminuir as diferenças cognitivas entre as nações mais desenvolvidas e as que lutam para reduzir a pobreza. Quais seriam as melhores opções para colocar os avanços da ciência e da tecnologia à disposição de todas as nações? A fuga de cérebros constitui um obstáculo?

O conceito de “diferenças cognitivas”, em inglês, não é claro. Se a pergunta significa que há um número diferenciado de pesquisas realizadas no Primeiro, Segundo, Terceiro e Quarto Mundos, então isso é meramente um índice de desigualdades naqueles quatro mundos. Tal como com a distribuição de doença, fome e padrões da vida diária, isso reflete as diferenças de capital politico, econômico e cultural que são desiguais entre os quatro mundos. Claramente, os esforços redistributivos internacionais através de instituições divergentes como a UNESCO e o Banco Mundial já estão em prática. A resposta óbvia é aumentar o número de agências regionais e internacionais que lutam por maior igualdade, ou as desigualdades deveriam ser abolidas – embora ninguém saiba como conseguir isso.

A contrapartida óbvia é observar seriamente a ascensão do Sudeste asiático (e seus países individualmente) dentro das hierarquias mundiais. No início da década de 1950, Gana era não apenas mais rica que a Coreia (do Norte e do Sul), mas parecia ter mais riqueza potencial. Não há explicações precisas para tais processos; certamente não há soluções universalmente aplicáveis que possam funcionar de forma garantida.

Não temos conhecimento suficiente sobre as histórias, economias, sociologias e políticas das sociedades para oferecer “soluções” – embora agências internacionais como a

112

Entrevista

INTEGRACIÓN Y CONOCIMIENTO

N° 4

 

ISSN 2347 - 0658

Año 2016

OCDE e o Banco Mundial achem que podem; naturalmente, espera-se que elas pensem e enfatizem que podem. Esse é o seu papel e sua crise permanente.

A “fuga de cérebros” tem sido um conceito útil. Atualmente, em 2015, o mundo (fluxos internacionais de pessoas, ideias, redes de pesquisa) mudou e o vocabulário deveria ser ampliado para incluir conceitos tais como “circulação de cérebros” e “mobilidade acadêmica internacional”. Obviamente, isso será configurado por fortes relações com as hierarquias mundiais – porém é desaconselhável pensar em linhas retas e usar categorias lineares como “fuga de cérebro”.

CC:Quais as maiores dificuldades e obstáculos para dar primazia à dimensão social da universidade e nortear o seu desenvolvimento como uma instituição fundamentalmente comprometida com o bem coletivo?

RC: A questão do papel social da universidade inclui o impacto político, econômico e cultural da universidade. Na França e na Inglaterra, por exemplo, o papel das Grandes Écoles e das universidades de Oxford, Cambridge e Londres no treinamento das elites políticas e administrativas sempre foi extremamente transparente. Na Alemanha e na União Soviética, o papel da universidade e sua contribuição econômica sempre foram óbvios. No País de Gales, na Escócia, Noruega e Dinamarca, o papel da universidade na formação e manutenção da identidade nacional tem sido igualmente relevante. A categoria “dimensão social” oculta essas diferenças cruciais – não apenas para o governo inglês que está buscando, com uma autoconfiança extraordinária, políticas de reforma para as universidades influenciadas de forma excessiva por visões de uma economia do conhecimento - e que pouco agem para discutir a questão, que é demasiadamente complexa, da conceitualização (a nível de ação) de uma visão da sociedade do conhecimento. Ao mesmo tempo, as desigualdades sociais e econômicas estão crescendo a passos rápidos e – se tais tendências continuarem – provavelmente esses novos padrões de desigualdade terão efeitos dramáticos na estrutura social, no equilíbrio entre os partidos políticos e – de forma potencial e triste – na estabilidade política, incluindo a identidade do próprio “Reino Unido”. O sucesso econômico, tal como está sendo construído atualmente na Inglaterra, pode ser acompanhado de um preço bastante alto.

CC:Se os obstáculos atuais para fazer da universidade uma instituição voltada para o bem comum continuarem, como você visualiza seu futuro? Pode-se afirmar que ela se encontra numa encruzilhada?

RC: As universidades nunca existiram para servir o mundo. Elas sempre existiram para servir específicas versões de uma boa sociedade, bom conhecimento e de um bom ser humano – seja ela a Universidade de Salamanca, Bolonha, Paris ou Al-Ahzar; ou Moscou,

113

Entrevista

INTEGRACIÓN Y CONOCIMIENTO

N° 4

 

ISSN 2347 - 0658

Año 2016

Wisconsin ou Londres. Na melhor das hipóteses, as universidades – posicionadas entre os preconceitos e as políticas de Reis e Igrejas – eram capazes de desenvolver suas próprias vozes, embora, na prática, tenham permanecido alertas às preocupações do “Rei” e da “Igreja”, mesmo após as revoluções de 1776 (Estados Unidos) e 1789 (França).

CC:Critica-se muito a universidade na América Latina em sua resistência para uma maior articulação com os setores produtivos. Como o senhor analisa essa questão?

RC: Uma possibilidade – embora isto dependa do contexto nacional - é não dar prioridade a uma possível função da universidade em relação à sua contribuição para o setor produtivo, supondo-se que este não seja seu papel. Inventem novas instituições, redirecionem e aumentem recursos para fortalecê-las (independentemente se forem denominadas “politécnicas” ou Fachhochschule1 - expressões antigas - ou mesmo nomes modernos); elas executarão esse trabalho com entusiasmo. Implementem parques industriais, centros científicos e tecnológicos inovadores, redefinam a legislação tributária, incentivem prêmios financeiros e criem fundações em ciências aplicadas.

Em outras palavras, a opção é pensar de forma divergente, além do conceito de universidades, fugindo do mito segundo o qual construir um Vale do Silício é meramente uma questão de ter jovens inteligentes e interessados em computadores, vizinhos de investidores de capital de risco, em um local onde há muitas universidades.

CC:Com base em sua larga experiência e conhecimentos produzidos mediante vários anos de intensa atividade científica e como teórico de referência no campo da educação comparada, como o senhor imagina uma política de internacionalização da educação superior com vistas aos compromissos internacionais de desenvolvimento sustentável?

RC: Internacionalização tem diversos significados, em relação a políticas. Na prática, internacionalização pode significar obter recursos financeiros a partir de taxas universitárias de estudantes estrangeiros. Internacionalização pode também significar fazer ajustes, em grau maior ou menor, no currículo para adaptá-lo às necessidades dos estudantes estrangeiros. Internacionalização pode ainda significar uma política deliberada de intercâmbio de docentes com universidades estrangeiras ou um recrutamento deliberado e crescente de acadêmicos estrangeiros em campi avançados no exterior (como a Universidade de Nottingham implementou na China). Nenhuma dessas políticas implica maiores esforços relativamente à estratégia de desenvolvimento sustentável.

1Instituições de ensino superior na Alemanha, voltadas para engenharia, tecnologia ou negócios.

114

Entrevista

INTEGRACIÓN Y CONOCIMIENTO

N° 4

 

ISSN 2347 - 0658

Año 2016

 

 

CC:A criação de programas conjuntos de pesquisa e pós-graduação entre universidades latino-americanas e universidades de países avançados pode ser um caminho para diminuir a distância cognitiva?

RC: Certamente. Entretanto, apoiar-se em categorias antigas de países desenvolvidos e em desenvolvimento, ou países industrializados e não industrializados pode ser substituído por conceitos de região (por exemplo, NAFTA, UE, MERCOSUL) ou por categorias mais complexas de fluxos transnacionais. Desenvolver elos entre países latinoamericanos e um ou dois países “desenvolvidos” pode talvez ser uma forma errônea de pensar a questão de relações. Noções de fluxos complexos, relações institucionais complicadas e fluidas em muitas áreas disciplinares e em locais geográficos múltiplos, bem como políticas muito flexíveis, são, provavelmente, a melhor forma de focalizar o problema - em grande parte dependendo de iniciativas institucionais e esforços dos acadêmicos muito mais do que políticas emanadas de um núcleo centralizado.

CC:Que experiências de internacionalização da educação superior estão sendo bem sucedidas hoje no mundo?

RC: A Austrália ganhou muito dinheiro. Os Estados Unidos e a Europa utilizaram em grande escala o soft power para se tornarem “visíveis”; universidades e instituições de grande prestígio e importância, como o Imperial College, London School of Economics and Political Science, Harvard, MIT, Caltech, Oxford e Cambridge, vêm atraindo enorme quantidade de talento internacional para seu corpo docente. Em outras palavras, não há um fenômeno único denominado “internacionalização” atuando em caminhos uniformes. Não há conjuntos principais e coerentes de quatro, cinco ou seis táticas que podem ser catalogadas, em ordem de classificação, como medidas de sucesso. Há, em vez disso, uma variedade e confusão de políticas que vêm sendo rotuladas como internacionalização. O que é internacionalização e de que forma a internacionalização está associada a problemas como legislação, visto, direitos de residência e esforços de política nacional e externa, continuam motivos de discussão.

CC:Os Brics (Brasil, Russia, India, China e África do Sul) desenvolvem esforços para a internacionalização da educação superior, em variados graus, como estratégia de não ficarem para trás no que diz respeito à produção e aplicação de conhecimentos. Como o senhor analisa a política da educação superior desses países? Estão no rumo certo?

115

Entrevista

INTEGRACIÓN Y CONOCIMIENTO

N° 4

 

ISSN 2347 - 0658

Año 2016

RC: Brics é uma expressão jornalística, inventada ou tornada popular por economistas e pela revista jornalística The Economist. Em contraste, o conceito de “pequenas ilhas” tem se tornado um tema de políticas entre aqueles preocupados com “desenvolvimento”. Em outras palavras, a expressão “pequenas ilhas” é, ao mesmo tempo, um conceito geográfico e um conceito de política. É bastante diferente do conceito de “Continente” que permanece primordialmente um conceito geográfico tradicional. Não é, contudo, um conceito de política que tem despertado o interesse internacional para a política educacional (por exemplo, das agências internacionais).

De forma geral, a contrapartida é bem clara: a expressão Brics não é uma nítida expressão geográfica nem uma nítida categoria de política. É simplesmente uma conjetura jornalística sobre o futuro, baseada em proposições relativas à populacão, recursos naturais e potenciais para desenvolvimento econômico. A proposição “Brics” – mesmo considerando a anexação de última hora da África do Sul – é baseada em hipóteses não muito sensatas sobre estabilidade política futura. Atualmente, Brics não representa uma categoria analítica útil para refletir coerentemente sobre políticas educacionais. Pode vir a ser; ou pode permanecer no nível de uma banalidade jornalística.

CC:Em sua opinião, o Pacto de Bolonha constitui uma referência para os países latino-americanos?

RC: Do ponto de vista sociológico e político o Processo de Bolonha tem suas raízes nas Guerras Mundiais e na reestabilização de um continente europeu profundamente chocado por milhões de mortes que resultaram dos desastres políticos, representados por palavras como no título do livro Bloodlands, a Alemanha nazista, o Holocausto e os horrores internos da União Soviética no período stalinista. O colapso da União Soviética permitiu que a União Europeia (UE) fizesse uma escolha entre ser uma “Casa Europeia” (um mosaico de culturas complexas denominadas Bélgica, França, Espanha etc.) ou um bloco econômico unificado por uma visão econômica neoliberal de uma força de trabalho móvel, de capital móvel, de locais móveis de produção e de uma mão-de-obra com habilidades de alto nível e mensuráveis e de qualificações equivalentes. A União Europeia escolheu a segunda opção – um bloco econômico competitivo e coerente com condições, em princípio, de competir no cenário mundial.

Obviamente, a América Latina pode copiar algumas das técnicas e práticas da UE (elaborando equivalências relativas a qualificações para o trabalho etc., como tem sido feito dentro do NAFTA). Entretanto, as condições políticas que historicamente construíram a UE, incluindo a firme determinação de duas das mais poderosas nações dentro da Europa

França e Alemanha – não encontram correspondentes precisos dentro da América Latina. É incerto, portanto, que exista na América Latina, no futuro imediato, a vontade política e a determinação necessária para construir a “União” – mesmo que aproximações

116

Entrevista

INTEGRACIÓN Y CONOCIMIENTO

N° 4

 

ISSN 2347 - 0658

Año 2016

técnicas e de gestão às políticas europeias possam ser implementadas. Existe ainda uma triste questão, no momento, referente à qualidade da liderança política na América Latina – quem levaria isto adiante? A Presidente do Brasil? Da Argentina? O Presidente da Venezuela? Ou Presidentes de países latinoamericanos de menos influência e sem a riqueza do petróleo?

CC:A política de mobilidade docente e discente praticada pela União Europeia configura-se como um dos caminhos para a internacionalização da educação superior?

RC: Seria melhor continuar pensando em programas como Erasmus, como partes de programas de mobilidade dentro da UE, que objetivam a aquisição de habilidades linguísticas, qualificações equivalentes, contato com culturas estrangeiras e elos deliberados entre universidades do Norte e do Sul, do Leste e do Oeste, como parte do Processo de Bolonha, no lugar de destruir essa política relativamente precisa, utilizando um conceito confuso e demasiado amplo de internacionalização.

CC:Em que medida as influências externas podem ajudar a colocar as universidades das nações em desenvolvimento no circuito contemporâneo de avanços científicos e tecnológicos? Como poderia ser a política de cooperação?

RC: A política crucial a ser perseguida é a provisão de recompensa financeira – grandes valores monetários – para universidades que partipassem integralmente de mobilidade acadêmica internacional. A CAPES tem realizado um trabalho extraordinário no contexto latinaomericano em relação a programas de desenvolvimento, experiência internacional e mobilidade de docentes. Mas, como indicado anteriormente, as relações entre as universidades e entre redes disciplinares vêm tornando-se tão complexas e fluidas que provavelmente não seja importante incorporá-las a uma visão de política que abranja pressupostos em linhas retas (tais que trilhos de trens e bondes); ou a uma visão de política que enfatize definições, selecionadas a nível central, do que são “excelentes” e “boa” universidades, com base em alguma definição de classificações mundiais de universidades, a partir de critérios de gestão.

CC:Se o Século XXI vem sendo considerado por alguns especialistas como o século de luta pela universalização da cidadania, como você imagina o papel da universidade nesse cenário de crescimento dos movimentos sociais?

117

Entrevista

INTEGRACIÓN Y CONOCIMIENTO

N° 4

 

ISSN 2347 - 0658

Año 2016

RC: Até onde se saiba o conceito de cidadania global (histórica, política e socialmente) e até onde se saiba que agência ou qual movimento político está propondo universalizá-lo, essa questão não tem resposta. Como sempre, ela depende de quem define o “bem público”, com base em qual sistema de valores. Observe-se que Stalin tinha visões bem nítidas relativas à importância da universalização da cidadania, uma visão que era um desastre para os kuláks, os cossacos e a maioria dos europeus do Leste. O paradoxo é que a visão estendeu-se à cidade onde Kant fazia suas caminhadas e elaborava suas ideias.

CC:Quais os pontos que você considera mais relevantes para a política da educação superior na América Latina e no Caribe?

RC:

Continuar com a distinção entre universidades de qualidade média que absorvem a demanda social para a igualdade de oportunidades educacionais, ao mesmo tempo em que se reforçam as aspirações internacionais por excelência de um menor número de universidades que desejam se empenhar para atingir uma reputação internacional.

Claramente, isto envolve julgamentos sobre “qualidade internacional” da produção dos acadêmicos brasileiros o que, infelizmente, talvez tenha que ser baseado em publicação de pesquisas nos dez periódicos internacionais mais importantes, em campos disciplinares específicos, embora isto não deva axiomaticamente significar publicação em periódicos de língua inglesa.

Estabelecer sistemas de premiação que apoiem as universidades cuja definição de qualidade integre a ideia de ser centrada parcialmente no envolvimento econômico e social de suas próprias regiões. O modelo básico é uma versão contemporânea dos Land Grant Colleges americanos.

Evitar o desenvolvimento de um grupo de gestores tecnocratas para administrar as universidades latinoamericanas. As universidades devem ser baseadas em uma visão de excelência acadêmica, do seu papel social e político nas sociedades. Tais visões são, ao mesmo tempo, demasiadamente importantes e delicadas para serem decididas e oferecidas por pessoas cuja maior pretensão competência é capacitação em gerenciamento.

CC:Quais as questões mais prioritárias que você recomenda para a construção de uma universidade latino- americana, como a Universidade Federal da Integração Latino-Americana (UNILA), autônoma, crítica e socialmente comprometida?

118

Entrevista

INTEGRACIÓN Y CONOCIMIENTO

N° 4

 

ISSN 2347 - 0658

Año 2016

RC: Provavelmente, eu evitaria o nome “universidade”. Dependendo da cidade, daria a essa Fundação de Ensino Superior o nome de um romancista, poeta, cientista natural ou teórico social que simbolizasse autonomia intelectual, espírito crítico ou envolvimento social. Dever-se-ia assegurar que a universidade fosse financeiramente autônoma e capaz de recrutar, por meio de financiamento de bolsa de estudos, 500 candidatos a cursos de mestrado e doutorado. Dever-se-ia garantir, ainda, que fluxos financeiros da universidade, garantidos por 10 (dez) anos, permitissem o recrutamento de acadêmicos estrangeiros na proporção de 20% do corpo docente, por meio de contratos de, pelo menos, 05 (cinco) anos. O Conselho Curador deveria, por lei, ser composto de menos de 10% de advogados, empresários e representantes da mídia, todos com carreiras “bem-sucedidas”. Idealmente, 20% do Conselho de Curadores deveriam ser da América Latina, mas não do país-base da Fundação. O lema da UNILA deveria ser algo como Originalidade e Crítica.

CC:Estudos comparativos entre as universidades dos diversos países podem contribuir para a redução da acentuada desigualdade existentes entre elas?

RC: Os estudos de Educação Comparada podem incluir a “elaboração de mapas”, isto é, um esboço de topografias de desigualdades. Tais topografias relatam déficits por meio de indicadores de percentual de “x” na população e de seu desempenho no sistema educacional (não importa se “x” representa os deficientes físicos ou minorias religiosas ou raciais, mas uma das medidas cruciais é a de desigualdades de classes sociais). O que fazer em relação a essas desigualdades é deduzível dos sistemas de valores definidos, por exemplo, pelos princípios religiosos ou políticos; as instituições a serem utilizadas para melhorar essas desigualdades devem variar de acordo com o tempo e o local. Por exemplo, o Japão enfatizou a política de alfabetização para todos, em 1868. O Brasil passou a considerar essa política de maneira séria mais de um século depois.

Nesses padrões idiossincráticos de ação institucional, o papel da universidade, na discussão de desigualdades, precisa de decisão local. Por exemplo, após 1917 (como indicado anteriormente), a universidade soviética abordava a questão de desigualdade de classes recusando admitir pessoas que, antes da revolução tivessem pertencido a classes sociais “altas”. Ao contrário, os americanos foram bem sucedidos em relação ao critério de acesso das várias classes sociais ao ensino superior, mas não se deram bem na remoção da questão de raça como um fator discriminatório do acesso à universidade até bem depois de 1954, com a decisão da Suprema Corte dos Estados Unidos em relação ao julgamento do caso Brown e Topeka.

CC:Em que sentido as circunstâncias políticas, econômicas e culturais podem ou não contribuir para uma política ética de internacionalização da educação superior?

119

Entrevista

INTEGRACIÓN Y CONOCIMIENTO

N° 4

 

ISSN 2347 - 0658

Año 2016

Todos os países discutem de forma harmoniosa e ética suas políticas de internacionalização do ensino superior. Contudo, muitos perseguem interesses pessoais nas políticas que envolvem relações culturais, econômicas e políticas entre os países.

Têm que assim fazê-lo porque o investimento a partir de recursos nacionais é sempre importante e seu uso deve ser determinado por uma conjuntura política. Em contrapartida, a “comunidade internacional” (até mesmo do tipo vago esboçado pela Declaração das Nações Unidas) é também política – sempre visível quando da indicação do Secretário-Geral de qualquer que seja a organização – e muito raramente capaz de administrar quantias de dinheiro necessárias para perseguir uma política mundial de “internacionalização”. Pouquíssimas universidades são ricas como Harvard, cujo orçamento é maior de que o de muitas das pequenas nações. Infelizmente, essa riqueza vultosa é necessária ao privilégio de incluir alguma versão do bem internacional.

Assim, estamos de volta aos governos nacionais que perseguem políticas diplomáticas, culturais, econômicas e de desenvolvimento, no âmbito das relações internacionais. “Internacionalização” deve ser entendida como um ideal (parcialmente definido de acordo com o pensamento de Kant e parcialmente sustentado por gerações de acadêmicos universitários e “iberais” ao longo dos anos). Na prática, “internacionalização”

éuma política no nível de política (partidária), perseguida por universidades e governos. Os contextos nos quais a internacionalização pode ser perseguida como uma visão moral e ética, traduzida em ação benigna e liberal, precisam ser identificados. Se esses contextos não forem especificados, entenderemos muito pouco a aspiração por uma “política-tipo- internacionalização”. Verdadeiramente, a questão crucial é: de quem é a aspiração contida nas políticas internacionais de 2015?

Muito obrigado

120

Entrevista