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RELEITURA DO MANIFESTO LIMINAR DE 1918 NO
MARCO DAS IDEIAS DE EDGAR MORIN?
RECIBIDO: 10/09/2018
ACEPTADO: 25/09/2018
Buscando un maestro ilusorio se dio con un mundo. Eso "es" la Reforma: enlace vital de lo universitario con lo político, camino y peripecia dramática de la juventud continental, que conducen a un nuevo orden social. Antes que nosotros lo adivinaron ya en 1918 nuestros adversarios. (Roca, 1999 citado por Naishtat, 2013, p. 43)
Não se pode reformar a instituição sem antes reformar as mentes, mas não se pode reformar as mentes sem antes reformar as instituições (...). A própria ideia de reforma reunirá as mentes dispersas, reanimará as mentes resignadas, suscitará proposições (...) Devemos nos opor
àinteligência cega que quase assumiu o comando por toda parte. Dito de outra forma: devemos reaprender a pensar, tarefa de salvação pública que começa por si mesma. (Morin, 2013a, p. 191)
Célio da Cunha1 Universidade Católica de Brasília celio.cunha226@gmail.com
Fabrício de Oliveira Ribeiro1 Universidade Católica de Brasília fabriciofol@hotmail.com
81
PREÂMBULO DA RELEITURA
A mensagem de Deodoro Roca – um dos mais evidenciados líderes do movimento da Reforma Universitária de 1918 – apresentada na epígrafe foi extraída do texto ¿Qué es la Reforma universitaria? Esse trecho,
associado ao alerta aparentemente contraditório do antropólogo, sociólogo e filósofo Edgar Morin – transcrito do livro “A via para o futuro da humanidade” – nos ajuda a compreender e a justificar a importância de fazer uma releitura do Manifesto de Córdoba: da juventude Argentina de Córdoba aos homens livres da América, de 21 de junho de 1918. Assim, esse ensaio acadêmico configura uma revisita ao Manifesto, 100 anos após a sua publicação, na perspectiva de algumas ideias do Pensamento Complexo de Morin.
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impertinentes, eis o que se tornou o |
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Universitária teve seu escopo e marco |
gosto predominante destas escolas. (p. |
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histórico sustentado por três grandes |
162) |
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bandeiras, em prol da construção pioneira de |
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uma universidade |
DELINEANDO A |
QUESTÃO PARA |
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liberdade acadêmica, a |
REFLEXÃO |
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autonomia (Puiggrós, 2013). Essa reforma |
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“tem sido estudada e analisada em diferentes |
O livro intitulado “Complexidade e |
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ângulos: como movimento estudantil, como |
transdisciplinaridade: |
a |
reforma |
da |
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modelo |
original |
de |
institucionalidade |
universidade e do ensino fundamental” |
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universitária, |
como revolução |
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espiritual, |
apresenta dois valiosos artigos do pensador |
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como o acontecimento cultural e político” de |
Edgar Morin, publicados originalmente no |
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maior relevância nas décadas iniciais do |
ano de 1997, que auxiliam na conscientização |
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século XX na Argentina, emergindo uma |
de que a reforma do pensamento precisa |
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“nova juventude” que marcou a história |
acontecer junto com a reforma da instituição. |
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contemporânea |
da |
América |
Latina. |
Num deles, Morin (2000) chama |
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(Naishtat, 2013, p. 43). |
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atenção para os desafios do século XX e para |
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as graves consequências do pensamento |
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Córdoba mantinha o perfil do período |
tradicional ainda tão presente nas instituições |
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colonial ainda no princípio do século XX, |
de ensino. Segundo Morin (2000), esse |
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ignorando |
disciplinas |
como |
matemática, |
pensamento |
ancestral |
é um pensamento |
82 |
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idioma estrangeiro, física, direito público e |
reducionista, na medida em que (a) ignora os |
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música, até 1816. Sarmiento (1996) assim a |
desafios da complexidade; (b) separa e |
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descreveu |
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fragmenta as disciplinas; (c) reduz o |
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a universidade é um claustro em que |
complexo ao simples – separando o que está |
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todos usam sotaina e mantel; a |
ligado e unificando o que é múltiplo; (d) |
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legislação que se ensina, a teologia, toda |
despreza as |
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a ciência escolástica da Idade Média, é |
circular; (e) divide os problemas e |
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um claustro em que se encerra e |
unidimensionaliza |
aquilo |
que |
é |
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entrincheira a inteligência contra tudo o |
multidimensional; (f) expressa uma “visão |
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que sai do texto e do comentário. (p. |
determinista, |
mecanicista, |
quantitativa, |
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163) |
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formalista que ignora, oculta ou dissolve tudo |
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Um de seus reitores, Deão Gregório |
o que é subjetivo, afetivo, livre e criador”. |
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Funes (citado por Sarmiento, 1996), escreveu |
(Morin, 2000, p. 11); (g) perde a |
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O curso teológico durava cinco anos e |
oportunidade de compreender e refletir, bem |
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meio... A teologia participava da |
como corrigir ou construir uma visão de |
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corrupção |
dos |
estudos |
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filosóficos. |
longo prazo; (h) desenvolve uma inteligência |
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Aplicada a filosofia de Aristóteles à |
cega, “inconsciente e irresponsável, incapaz |
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teologia, formava uma mistura de |
de encarar o contexto e complexo |
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profano |
e |
espiritual. |
Raciocínios |
planetários”. (Morin, 2000, p. 12); e (i) separa |
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puramente |
humanos, |
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sutilezas, |
a cultura humanista da cultura científica. |
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sofismas enganosos, questões frívolas e |
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Tomando como ponto de partida o conteúdo inscrito no Manifesto de Córdoba no marco de seu centenário, o presente texto acadêmico propõe a seguinte reflexão: em que medida, o Pensamento Complexo formulado pelo filósofo Edgar Morin contribui para reafirmar a necessidade histórica de repensar e reformar o Ensino Superior e a universidade, simultaneamente à reforma do pensamento, a partir de releitura do Manifesto de Córdoba?
Assim,
Antes de avançarmos,
O pensamento complexo tenta religar o que o pensamento disciplinar e
compartimentado disjuntou e parcelarizou. Ele religa não apenas domínios separados do conhecimento, como também – dialogicamente – conceitos antagônicos como ordem e desordem, certeza e incerteza, a lógica e a transgressão da lógica. É um pensamento da solidariedade entre tudo o que constitui nossa realidade; que tenta dar conta do que significa originariamente o termo Complexus: “o que tece em conjunto”, e responde ao apelo do verbo latino complexere: “abraçar”. O pensamento complexo é um pensamento que pratica o abraço. Ele se prolonga na ética da
solidariedade. (Morin, 1997, p. 11). [Itálico do autor]
Atransdisciplinaridade, como o prefixo
‘trans’ indica, diz respeito àquilo que está ao mesmo tempo entre as disciplinas, através das diferentes disciplinas e além de qualquer disciplina. Seu objetivo é a compreensão do mundo presente, para o qual um dos imperativos é a unidade do conhecimento. (Nicolescu, 1999, p. 53). [Itálico do autor]
As ideias prospectivas e o pensamento
complexo de Edgar Morin vão ao encontro dessa necessidade de mudança continuada da universidade, à luz dessa releitura do Manifesto anunciado no ano de 1918, numa época em que o espírito liberal emergente conflitava com o conservadorismo religioso, cuja “dialética complexa de tradição e
modernidade foi entrelaçada à custa de uma 83 dinâmica áspera da história oficial da Argentina”, ao tempo em que preconceitos mascaram a verdadeira missão da cidade de Córdoba na história nacional, enquanto “centro autêntico e complexo de irradiação intelectual e cultural”. (Navarro, 2013, p. 40)
Cabe ressaltar que uma reforma do pensamento implica a substituição de um pensar que desliga por um pensar que liga, sendo que isso pressupõe, segundo Morin (2000):
(a)que a inflexível lógica clássica seja substituída por uma dialógica que
contemplepercepções
“simultaneamente complementares e antagônicas, que o conhecimento da integração das partes ao todo seja completado pelo reconhecimento do todo no interior das partes”. (p. 13);
(b)o desenvolvimento de uma cultura geral e diversificada, bem como de uma
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potente atitude focada na contextualização, na conceitualização, na globalização e na resolução de problemas específicos;
(c)uma reforma paradigmática e não pragmática da Universidade, voltada para desenvolver nossa competência para sistematizar o conhecimento; e
(d)a elaboração de um pensamento do contexto e do complexo.
RELENDO O MANIFESTO DE CÓRDOBA A PARTIR DO PENSAMENTO DE EDGAR MORIN
Ressignificando o Manifesto de Córdoba a partir do pensamento complexo e transdisciplinar de Morin,
De acordo com Buchbinder (2013), o diagnóstico que os discentes elaboraram sobre a situação da universidade era compatível com questionamentos de estudiosos da temática, cujo “movimento reformista ganhou corpo exatamente por
Em consonância com a questão central delineada,
marcadas por greve por tempo indeterminado, que contaram com o apoio de sindicatos, políticos de esquerda e intelectuais de distintos posicionamentos. (Freitas Neto, 2011)
Assim,
1) A privação da liberdade
As dores que ficam são as liberdades que 84 faltam. Acreditamos que não erramos, as ressonâncias do coração nos advertem: estamos pisando sobre uma revolução, estamos vivendo uma hora americana (...). À enganação respondemos com a revolução (...) Fizemos então uma santa revolução e o regime caiu a nossos golpes. (Manifesto de Córdoba, 1918)
A ausência de liberdade era percebida no aprisionamento discente, que não tinha espaço para a criatividade, sendo assim denunciada a falta de exploração do potencial criativo discente:
Teria que considerar o estudante em sua função criativa como aquele grande transformador que, com sua atitude filosófica, transporta e conduz novas ideias, que antes de surgirem nas ciências surgem na arte e na vida social,
para
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Naishtat, 2013, pp.
A falta de liberdade certamente está associada à insuficiência de desenvolvimento da autonomia, possibilitada a partir da compreensão da complexidade humana, uma
vez que “todo desenvolvimento verdadeiramente humano significa o desenvolvimento conjunto das autonomias individuais, das participações comunitárias e do sentimento de pertencer à espécie humana”. (Morin, 2011b, p. 49)
A privação de liberdade dos estudantes
No entanto, cabe lembrar que a autonomia é sempre relativa. Esse autor ressalta que a autonomia se nutre da dependência de fatores culturais e sociais, a exemplo de educação, linguagem e sociedade. Portanto,
capacidade de autoconhecimento,
autorreflexão, autoprodução e autotransformação – a partir de processos interacionais com o meio ambiente, com outros indivíduos e com a sociedade. “Ser sujeito é ser autônomo, sendo ao mesmo tempo dependente. É ser alguém provisório, vacilante, incerto, é ser quase tudo para si e quase nada para o universo”. (Morin, 2007, p. 66)
2) O silenciamento da ciência
(...) a ciência frente a essas casas mudas e fechadas, passa silenciosa ou entra mutilada e grotesca no serviço burocrático (...). O estalo do chicote só
pode atestar o silêncio dos inconscientes e dos covardes. A única atitude silenciosa, que cabe em um instituto de ciência é a do que escuta uma verdade ou a do que experimenta para acreditar ou
Naishtat (2013, p. 60) chancela os gritos evidenciados no Manifesto de 2018 e chama atenção para a verdadeira missão da
universidade enquanto instituição responsável “pela verdade, pela crítica, pelo cuidado do pluralismo da palavra, pela ilustração da sociedade no conhecimento e no amor à ciência e à arte, qualquer que seja seu campo de intervenção política”.
Morin (2014) alerta para a necessidade de um pensamento que encare a complexidade do real, possibilitando, simultaneamente, que a ciência efetue uma autorreflexão sobre si mesma. Esse pensador
aponta alguns caminhos como proposta para 85 uma nova política de investigação, com destaque para os seguintes aspectos: (a) que a tecnoburocracia da ciência não sufoque seus traços de incerteza; (b) que os pesquisadores tenham capacidade de autointerrogação, numa dinâmica de autoanálise da ciência; e
(c)que sejam fomentados processos que levem a revolução científica a modificar os sistemas de pensamento.
A burocracia pode ser altamente prejudicial para a evolução da ciência, na medida em que seja compreendida como um
“conjunto parasitário onde se desenvolve toda uma série de bloqueios, de atravancamentos que se transformam em fenômeno parasitário no seio da sociedade”.
(Morin, 2007, p. 91).
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e “a ordem, a regularidade, a constância, e, sobretudo, o determinismo absoluto”. (Morin, 2000, p. 44)
Nesse contexto, Morin (2000, p. 15) indica algumas vias para a reforma, afirmando a importância de priorização de alguns fatores para que a ciência tenha vez e voz,
progresso”, ressaltando: “o que acreditávamos que era a razão e que amiúde não era mais do que uma racionalização abstrata”; “a própria organização do pensamento e da instituição universitária”.
Morin (2000) também sublinha que uma sistematização do saber já foi iniciada com o reagrupamento de disciplinas que se encontravam separadas e propõe, para o ensino universitário, (a) a criação de departamentos ou institutos voltados para reintegração polidisciplinar de ciências afins e centro de investigação sobre problemas da complexidade e da transdisciplinaridade; e (b) a adoção de um “dízimo transdisciplinar” dedicado à resolução de problemas
transdisciplinares, a exemplo da interdependência existente entre as ciências. Nesse contexto, explica a conexão entre
transdisciplinaridade e os domínios científicos, a exemplo de física, biologia e antropossociologia
A ciência nunca teria sido ciência se não tivesse sido transdisciplinar. (Morin, 2000, p. 37) [Itálico do autor]. Para promover
uma nova transdisciplinaridade precisamos de um paradigma que, certamente, permita distinguir, separar,
opor e, portanto, disjuntar
relativamente estes domínios
científicos, mas que, também, possa
3)O regime universitário fossilizado
Nosso regime universitário – mesmo o mais recente – é anacrônico. Está fundado sobre uma espécie de direito divino; o direito do professorado universitário. Acredita em si mesmo. Nele nasce e nele morre. Mantêm uma distância olímpica. (Manifesto de Córdoba, 1918)
Ao analisar as controvérsias existentes entre o antigo regime e a Reforma de 1918, Buchbinder (2013, p. 11) denuncia que, nos primeiros anos do século XX, as instituições de Ensino Superior da Argentina “não contribuíam para a formação da alma nacional – permaneciam à margem do
movimento cultural, não realizando
contribuições significativas para o 86 desenvolvimento da cultura nem da ciência”.
Essa tipologia de regime não considera a necessária conexão que deve existir entre sociedade e universidade, uma relação que precisa ser harmônica e solidária, em que uma deve polinizar a outra. Morin (2000) questiona se a universidade deve
Nesse sentido, Morin (2013a, p.194) sinaliza que reformar a universidade implica introduzir temáticas como “o conhecimento do conhecimento; o conhecimento do humano, o conhecimento da era planetária, a compreensão humana; o enfrentamento das incertezas; a ética trinitária (indivíduo-
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pensador enfatiza que reformar o pensamento implica formar uma “cabeça
(a)assumir que sua missão e função são transeculares e transnacionais, em consonância com suas características conservadora – para salvaguardar e preservar a herança cultural de saberes, ideias e valores
(b)
(c)promover uma reforma de pensamento que leve à reforma da universidade, especialmente quanto à reorganização geral das áreas ou faculdades relativas às ciências que já se conectaram do ponto de vista multidisciplinar, quebrando de vez o paradigma da compartimentação entre as ciências e as disciplinas e criando, por exemplo, uma Faculdade do Cosmo (incluindo o campo filosófico), Faculdade da Terra (ciências da Terra, Ecologia, Geografias Física e Humana), Faculdade do Conhecimento e Ciências Cognitivas; Faculdade da Vida; Faculdade de História; Faculdade dos Problemas Globalizados; Faculdade de Letras (incluindo artes e cinema), cujos diplomas e teses ganhariam um caráter multi e transdisciplinares; uma espécie de Faculdade que aborde temáticas comuns (10 % da duração dos cursos),
a exemplo de interpretação,
argumentação,pensamento matemático, cultura das humanidades e cultura científica, com a finalidade de realizar a conexão entre as ciências antropossociais e as ciências da natureza;
(d)criar um instituto de pesquisas relativas aos problemas de complexidade e de transdisciplinaridade; e
(e)difundir, no mundo social e político, valores como “a autonomia da consciência, a problematização (com a consequência de que a pesquisa deve ser sempre aberta e plural), o primado da verdade sobre a utilidade, a ética do conhecimento”. (Morin, 2011a, p. 82)
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1918 deu continuidade em julho do mesmo |
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ano com a realização do I Congresso |
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Nacional de Estudantes Argentinos na cidade |
87 |
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de Córdoba, cujas demandas apresentadas no |
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Manifesto foram reafirmadas de maneira |
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mais substancial, modificando assim o regime |
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universitário, conforme |
sintetizado |
por |
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Freitas Neto (2011): |
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coparticipação dos |
estudantes |
na |
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estrutura |
administrativa; |
participação |
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livre nas aulas; periodicidade definida e |
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professorado livre das cátedras; caráter |
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público das sessões e instâncias |
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administrativas; |
extensão |
da |
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universidade para além dos seus limites |
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e difusão da cultura universitária; |
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assistência |
social |
aos |
estudantes; |
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autonomia |
universitária; |
universidade |
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aberta ao povo. (p. 67)
Éoportuno exemplificar algumas mudanças que ocorreram na Universidade de Córdoba e outras que se reconstituíram no século XX, segundo Freitas Neto (2011, p. 69): modificação de práticas e regulamentos
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“para evitar o encastelamento e o enrijecimento da estrutura docente”; liberdade para matricular nas disciplinas; e flexibilização na oferta de cursos e disciplinas extrínsecas às cátedras convencionais –
4)A autoridade ditatorial do diretor e do professor, que se fecha em sua disciplina
O conceito de autoridade que corresponde e acompanha um diretor ou um professor em um lar de estudantes universitários não pode
Puiggrós (2013) informa que os aprendentes recusavam o cientificismo positivista articulado ao regime ditatorial e oligárquico que predominava na América Latina e assim mitigava o desenvolvimento da ciência e da tecnologia requeridas para promoção do avanço do processo de industrialização do período. O isolamento das disciplinas e a não contextualização dos processos de ensino e aprendizagem às realidades e necessidades dos sujeitos aprendentes, associados a uma autoridade controladora – revelada pela direção e corpo docente – produziam uma educação sem significado e sentido.
Nesse aspecto,
perigoso descompasso existente entre as |
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disciplinas |
isoladas, |
parceladas |
e |
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fragmentadas. |
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Ora, fracionar e decompor disciplinas é |
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perder a oportunidade de enxergar, ir além e |
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avançar no objeto do conhecimento, num |
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mundo em que as realidades e os problemas |
|
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são cada vez mais “polidisciplinares, |
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||||||
transversais, |
|
multidimensionais, |
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transnacionais, globais, planetários”. (Morin, |
|
||||||
2011a, p. 13) |
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e não exclui a disciplina, que possui seu valor |
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enquanto |
especialidade |
no |
conhecimento. |
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Sua crítica passa pela cegueira de não saber |
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“ver que muitas idéias nascem nas fronteiras |
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e nas zonas incertas e que grandes |
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||||||
descobertas ou teorias nasceram muitas vezes |
|
||||||
de forma indisciplinar”. (Morin, 2013b, p. |
|
||||||
560) |
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|
Esclarece |
que não há |
a intenção |
de |
88 |
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invalidar |
as disciplinas, |
mas |
|||||
|
las e
5)A desconexão entre educando e educador
Se não existe uma vinculação espiritual entre o que ensina e o que aprende, todo ensino é hostil e, por conseguinte, infecundo. Toda a educação é uma longa obra de amor aos que aprendem (...). Adiante, só poderão ser professores na república universitária os verdadeiros construtores de almas, os criadores de verdade, de beleza e de bem. (Manifesto de Córdoba, 1918)
A reforma da educação proposta por Morin (2013a, p. 200) possivelmente ajudaria a diluir essa hostilidade nos processos de ensino e aprendizagem, na medida em que
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pressupõe a formação de nova geração de professores. Esses novos docentes seriam constituídos daqueles que encontram no fazer pedagógico verdadeiro “sentido de uma missão cívica e ética para que cada aluno ou estudante possa enfrentar os problemas de sua vida profissional, de sua vida de cidadão, do devir de sua sociedade, de sua civilização, da humanidade”.
As vozes discentes sobre a relação
(II)a abertura subjetiva (simpática) não deve ser limitada a pessoas próximas estimadas; e
(III)a interiorização da verdadeira tolerância
(a)implica convicção, fé e escolha ética atrelada à receptividade e respeito simultâneo aos pensamentos, crenças e preferências distintas das nossas; e (b) pressupõe a compreensão e conscientização dos quatro níveis da tolerância – não imposição de nossa concepção sobre aquilo que é aparentemente desprezível ou insignificante; respeito às ideias e opiniões variadas e contrárias às nossas; respeito à verdade presente nas ideias antagônicas às nossas; e, ainda, “consciência das possessões humanas por mitos, ideologias, ideias ou deuses, assim como das consciência das derivas que levam os indivíduos bem mais longe, a lugar diferente daquele aonde querem ir”. (Morin, 2011b, p.
89)
A desconexão e a falta de qualidade nas relações interpessoais entre educando e educador também é denunciada por Morin (2013a, p. 200). Para esse filósofo, o ensino é
“relacional por natureza” e, assim, a
qualidade do relacionamento aprendente/professor impacta fortemente os processos de ensino e aprendizagem. Ao abordar a reforma do ensino e do pensamento, Morin (2000) afirma que uma ação dessa natureza deve prever a formação de formadores e a autoeducação dos educadores, requerendo amor para com a disciplina que ensina e também para com o educando a quem se ensina. Defende que é preciso conectar educador e educando pela aprendizagem do amor
como Platão o disse há muito tempo: para ensinar é preciso o eros. O eros não é somente o desejo de conhecer e de transmitir, ou somente o prazer de ensinar, de comunicar ou de dar: é também o amor daquilo que se diz e do que se pensa ser verdadeiro. É o amor
que introduz a profissão pedagógica, a 89 verdadeira missão do educador. (Morin, 2000, p. 52)
6)O método docente que aprisiona o aprendente
Os métodos docentes estavam viciados de um estrito dogmatismo, contribuindo em manter a universidade distante da ciência e das disciplinas modernas (...) Os corpos universitários, zelosos guardiões dos dogmas, tratavam de manter a juventude na clausura, acreditando que a conspiração do silêncio pode ser exercida contra a da ciência. (Manifesto de Córdoba, 1918)
A propósito, Buchbinder (2013) lembra da falta de comprometimento, arbitrariedade e autoritarismo docente, sobretudo nos momentos de avaliação dos educandos. Destaca que parte dos estudantes criticavam as “condições didáticas” dos professores – evidenciadas pela carência de conhecimentos
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e noções elementares das disciplinas que ministravam, suas limitações técnicas e científicas, currículos antiquados, excessiva carga teórica – privilegiando a retórica em detrimento da ciência; os laboratórios insuficientes e inadequados, além da ausência de experimentos práticos. Assim, desvela o quadro do instrucionismo que imperava nos tempos da mobilização rebelde de 1918, sendo claramente percebido pelos estudantes, que sublinhavam o quanto os professores eram dependentes dos livros didáticos, não sendo competentes para elaborar suas aulas de forma autônoma.
Morin (2000) lembra ainda que a Universidade conserva, mas também regenera e gera saberes, ideias e valores, revelando seu potencial de preservação, memorização, integração e ritualização dessa herança cultural. Por outro lado, alerta para a
diferenciação entre dois tipos de conservação: (a) vital – voltado para salvaguarda e preservação do passado; e (b) estéril – denota dogmatismo, fixação e rigidez. Afinal, uma “racionalidade científica
produz teorias biodegradáveis, diferentemente da racionalidade fechada (doutrina), que refuta a priori tudo o que a desestabilizará”. (Morin, 2013a, p. 193). [Itálico do autor]
O enclausuramento discente delatado pelos manifestantes da Universidade de Córdoba, em 1918, possivelmente decorre de
abordagens mais tradicionais e instrucionistas, que priorizam e continuam a martelar na dicotomia que insiste na separação e ignora a ligação – silenciando o aprendente, mutilando seu pensamento crítico e ‘ecologizante’, seu potencial criativo, sua capacidade de interrogar, de desconstruir e reconstruir conhecimentos, além de negar a sua aptidão para solucionar problemas a
partir de debates colaborativos, experiências e pesquisas individuais e/ou grupais.
autoformação. Não como essência, substância ou ilusão, mas a partir da superação do paradigma cognitivo e determinista clássico ainda tão entranhado nas ciências humanas e no universo científico
–em que o sujeito é invisível e sua existência é desprezada
incluaprincípioscomo
autonomia/dependência, individualidade,
autoprodução,produto/produtor, inclusão/exclusão. Ressalta que o universo
filosófico considera |
o sujeito um |
ser |
90 |
|
transcendental, |
privilegiando |
a |
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intelectualidade em detrimento de suas |
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experiências, dependências, fraquezas |
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incertezas. |
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7)A quebra de princípios e valores morais
Aquilo representa também a medida de nossa indignação na presença da miséria moral, da simulação e do engano arteiro que pretendia
A reforma de pensamento e a reforma da universidade certamente passam pela reforma ética, principalmente considerando essa ausência de luzes no sentido moral, conforme apontado nesse trecho do Manifesto de Córdoba. Ao propor uma reforma ética, Morin (2013a) valoriza o
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sentido e a dimensão da subjetividade humana, lembrando que o “eu” pressupõe uma autoafirmação egocêntrica do sujeito, mas simultaneamente – esse mesmo indivíduo – carrega em si um ser que é social, amoroso, altruísta e solidário, mesmo sendo instigado pela sociedade a expressar um comportamento associado ao egocentrismo em detrimento de comportamento voltado para a coletividade. Essa dupla reforma pode ser a “senha” para que as universidades vençam o desafio à luz das necessidades da reforma, afinal “o prestígio perdido devia ser devolvido às universidades e impedido de permanecer ‘o refúgio da apatia e da mediocridade’”. (Buchbinder, 2013, p. 22)
Nessa direção,
Os recentes ensinamentos de Morin vão diretamente ao encontro do alerta escrito por Deodoro Roca (1915 citado por Naishtat, 2013, p. 46), portanto, três anos antes da publicação do Manifesto de 1918:
A mais grave “falência” da era contemporânea é a falência da moral. A guerra atual evidencia todas as falhas
(...). Assim como a solidariedade das
inteligências serve ao trabalho científico, a solidariedade das vontades será útil para os sofrimentos humanos que devem ser aliviados, pelos vícios e erros que precisam ser curados, pelas ideias morais que precisam se espalhar. A fraternidade fundada na consciência "humana" da solidariedade será o campo fértil da futura semeadura moral.
É difícil resumir os vastos ensinamentos de Morin no campo da ética. No marco do Manifesto, cabe chamar a atenção para uma de suas reflexões:
compreender o adversário mesmo
refletir sobre a ética complexa, esse pensador 91 destaca que a ética precisa se nutrir de fé, conhecer o contexto em que é exercida; ser internalizada como ética da compreensão;
uma ética sem salvação e promessa; uma ética da incerteza, da contradição e do desafio.
A miséria moral inscrita e denunciada pelo Manifesto poderia ser criticamente iluminada pela autoética aconselhada por Morin (2013c, pp.
8) A negação do sujeito aprendente
Não podemos deixar nossa sorte à tirania de uma seita religiosa, nem ao jogo de
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interesses egoístas. Eles querem nos sacrificar. O que se intitula reitor da Universidade de San Carlos disse sua primeira palavra: “Prefiro antes de renunciar que fique o varal de cadáveres dos estudantes.” (Manifesto de Córdoba, 1918)
Essa passagem do Manifesto de 1918 sinaliza que a instituição escolar, na percepção dos estudantes, estava totalmente voltada para si mesma. Jogar com interesses egoístas é ignorar e rejeitar o sujeito aprendente, menosprezando o alcance da subjetividade humana. Ora, cabe à universidade dar o exemplo, inclusive, ensinando, debatendo publicamente e disseminando a verdadeira noção de sujeito, que, segundo Morin (2011a), é carregada de complexidade, a saber: (a) o egocentrismo remete ao princípio “eu sou tudo”, não obstante todo o mundo do sujeito se desmontará com sua morte e, exatamente por essa mortalidade, “eu sou nada”; (b) o egoísmo expressa a noção de que “eu sou tudo” e o “outro não é nada”; e (c) “no altruísmo, eu me dou, me devoto, sou inteiramente secundário para aqueles aos quais me dou”. (Morin, 2011a, p. 127)
Sacrificar o sujeito que aprende implica subtrair a dimensão humana, a vida, o progresso do conhecimento e da ciência. É papel da instituição educacional cuidar, preservar e desenvolver o sujeito aprendente
e, simultaneamente, o objeto do conhecimento, bem como quebrar o paradigma disciplinar. Cabe à instituição de ensino respeitar a autonomia, a singularidade, a individualidade, a subjetividade, a capacidade pensante e criativa do estudante – estimulando a formação de grupos colaborativos nos processos de ensino e
aprendizagem e de produção do conhecimento.
Na verdade, a instituição de ensino deve reconhecer a imbricada relação existente entre o sujeito e o objeto do conhecimento, sua inseparabilidade, complexidade e complementaridade. Para tanto, não pode desprezar, mas resgatar o sujeito rejeitado pelas correntes filosóficas de concepção mais objetivista, determinista e reducionista, a exemplo da ciência ocidental que, equivocadamente,
Nessa circunstância, os alertas de Morin (2007) a respeito do complexo e
indissociável binômio sujeito/objeto 92 merecem atenção no contexto educacional,
em destaque: (a) o objeto somente existe em relação a um sujeito – que é dotado da capacidade de observar, isolar, definir, pensar
–e somente existe sujeito tendo em consideração a presença de um meio ambiente objetivo que possibilite ao sujeito
a valorização do objeto implica reconhecimento do determinismo, enquanto que a valorização do sujeito resulta em indeterminação pautada em possibilidade e liberdade; e (c) o objeto é conhecível, determinável, isolável e manipulável, enquanto o sujeito é o desconhecido porque é indeterminado – um sujeito pensante e passível de
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CONCLUINDO PROVISORIAMENTE
Como se pode observar pela
comparação entre alguns excertos estruturantes do Manifesto de 1918 e as ideias de Edgar Morin,
Ao antecipar o que deveria ser uma universidade com autonomia, liberdade de pensamento e construtora de mentes humanas e, antes de tudo, formadora de pessoas – como queria Rousseau em pleno Século das Luzes que declarava a supremacia da razão
A opção por Morin para examinar a atualidade do Manifesto decorre da visão prospectiva do autor da Teoria da Complexidade que não somente critica a teia de relações desumanas hodiernas e o formato unidimensional da educação contemporânea, como também teve o mérito de construir um método e de apontar caminhos.
Portanto,
muito atual e remete a algumas considerações provisórias, por exemplo:
(a)A privação da liberdade acadêmica
mutila o desenvolvimento da autonomia e da criatividade discentes,
(b)Calar a voz dos estudantes pesquisadores pode culminar em silenciamento da ciência, dando lugar à ilusória certeza permanente e absoluta, à cegueira humana que bloqueia a realidade, a pluralidade, bem como a
multidimensionalidadedo conhecimento, da cultura e da vida.
(c)A modernização do regime universitário parece possível na medida em que a universidade incorpore
verdadeira e plenamente a sua missão |
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de promover o desenvolvimento do |
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homem e da ciência, abraçando a |
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complexidade e a transdisciplinaridade |
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inerentes ao mundo e à vida. |
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(d)A autoridade ditatorial e oligárquica do diretor e do professor pode ser ressignificada e substituída por uma gestão participativa e uma docência que valorizem as disciplinas, mas não o seu encastelamento – compreendendo que é preciso considerar aquilo que está, simultaneamente, entre as disciplinas, aquilo que as atravessa e se encontra em suas fronteiras e além delas: o ser humano e sua individualidade,
subjetividade, singularidade e complexidade.
(e)A imbricada e necessária relação existente entre educador e educando
nos processos de ensino e
aprendizagem
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quando o docente possui legítima vocação e amor à sua profissão. Relacionamentos interpessoais sadios tendem a contribuir para que os ambientes de aprendizagem sejam mais prazerosos, colaborativos e produtivos.
(f)Métodos educacionais centrados na
“didática do controle”
construção colaborativa do
conhecimento; e não incluem estratégias que potencializam as chances de aprendizagem.
(g)O rompimento de princípios e valores
morais deteriora instituições e desestimula aqueles que prezam por boas condutas e praticam a ética, a moral e os valores universais. Por outro lado, a preservação e o contínuo exercício da ética em suas diversas dimensões podem contribuir para a
elevação da autoética, da autoconsciência, da compreensão, da
lucidez, da fraternidade, da solidariedade e da cidadania.
(h)A rejeição do estudante por parte da instituição de ensino denota profundo desrespeito com o ser humano e com a própria instituição. Essa negação denota incapacidade e incompetência da universidade para assumir sua missão, seu papel, suas atribuições e
responsabilidades.
Por fim,
pensadores contemporâneos como Edgar Morin e tantos outros, podem contribuir para melhoria contínua e, oxalá, para a própria reconstrução e refundação da universidade – de modo que ela se torne aderente às reais necessidades do mundo e da vida, sendo, portanto, mais crítica, democrática, solidária e planetária. Assim,
REFERÊNCIAS
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