Ensino de física e jogos de cartas
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REVISTA DE ENSEÑANZA DE LA FÍSICA, Vol. 33, no. 2 (2021) 334
Entendemos que unicamente por meio da exposição de gráficos, fórmulas e pela repetição de exercícios, os estu-
dantes não se capacitam adequadamente para se posicionar ante a complexidade do mundo atual e da riqueza dos
conhecimentos científicos.
O ato de lecionar requer o uso de recursos de ensino que mobilizem os sujeitos envolvidos. As ferramentas lúdicas
poderão fornecer subsídios diferenciados para a atuação pedagógica do professor. Além disso, podem despertar a
atenção do aluno a fim de instigá-lo a se posicionar diante dos desafios apresentados no processo formativo, com o
auxílio dos jogos.
II. PANORAMA TEÓRICO: LÚDICO, JOGOS E APRENDIZAGEM
A palavra “lúdico” origina-se do termo em latim “ludus” que significa “jogo” (Almeida, 2009). Originalmente o termo
se referia apenas ao ato de jogar, brincar, em se realizar um movimento espontâneo. Entretanto, com o tempo a
definição de lúdico deixou de ser um simples sinônimo de jogo e passou a ser reconhecido como um elemento funda-
mental do comportamento humano.
Já em 1971 Piaget discutia que o desenvolvimento da criança pode acontecer por meio do lúdico. Também se-
gundo o autor, o conhecimento não ocorre por meio da reprodução, cópia da realidade, mas sim por meio de cons-
tantes construções segundo a interação com o real.
Conforme aponta Piaget (1967), “o jogo não pode ser visto apenas como divertimento ou brincadeira para desgas-
tar energia, pois ele favorece o desenvolvimento físico, cognitivo, afetivo e moral” (Piaget, 1967, p. 25). O jogo não é
um mísero instrumento para se divertir, distrair ou passar o tempo. Ele apresenta um importante destaque na educa-
ção, pois estimula o crescimento e o desenvolvimento, através da observação, iniciativa pessoal e análise situacional,
além de oferecer ao indivíduo a oportunidade de explorar sua criatividade, formulando hipóteses e testes.
Para Kishimoto (1994), em uma atividade lúdica o aluno torna-se sujeito do processo. Na aula com materiais lúdi-
cos o objetivo não é valorizar a produtividade e sim a interação do aluno, pois a brincadeira desperta nele o desejo do
saber e participar. “Quando a criança percebe que existe uma sistematização na proposta de uma atividade dinâmica
e lúdica, a brincadeira passa a ser interessante e a concentração do aluno fica maior, assimilando os conteúdos com
mais facilidades e naturalidade.” (Kishimoto, 1996, p. 24).
Lopes (2001) sugere com mais ênfase a aprendizagem com materiais lúdicos, dizendo que aprender por meio de
jogos é, ao seu ver, muito mais eficiente, inclusive com a confecção dos mesmos:
É muito mais eficiente aprender por meio de jogos e, isso é válido para todas as idades, desde o maternal até a fase adulta.
O jogo em si, possui componentes do cotidiano e o envolvimento desperta o interesse do aprendiz, que se torna sujeito ativo
do processo, e a confecção dos próprios jogos é ainda muito mais emocionante do que apenas jogar. (Lopes, 2001, p. 23)
Além das questões levantadas até aqui, Miranda (2002) indica que o jogo favorece o desenvolvimento de outros
aspectos, ao propor “um trabalho voltado ao exercício de habilidades como integração grupal, confiança mútua, es-
pírito de liderança, cooperação, decisão, iniciativa, autoconhecimento”. (Miranda, 2002, p. 32).
É no âmbito do Ensino Superior, mais especificamente nos cursos de formação de professores, que pudemos de-
safiar futuros professores com a confecção de ferramentas que podem contribuir para o processo de ensino e apren-
dizagem, mais especificamente com a construção e utilização de jogos.
III. PERCURSO METODOLÓGICO
Apresentamos neste trabalho parte de uma pesquisa qualitativa e exploratória, tendo como fontes (a) observações
de atividades didáticas, (b) relatos de docência e (c) pesquisa documental. A utilização de jogos como recurso didático
estava inserida em atividades de formação inicial de professores de Física, ocorridas no Laboratório de Prática de
Ensino, Materiais e Instrumentação Didática (LaPEMID) e em escolas públicas brasileiras de Educação Básica, onde as
regências do estágio supervisionado ocorreram.
Tais atividades foram desenvolvidas no âmbito da disciplina de Prática de Ensino e Estágio Supervisionado de Física
(aqui designada neste trabalho como PEF), do curso de Formação de Professores de Física, de uma Universidade Pú-
blica brasileira, localizada no interior do estado de São Paulo, no ano letivo de 2019.
Durante a disciplina PEF, os futuros professores foram instados a desenvolver e confeccionar jogos que pudessem
ter como assunto e regras os conteúdos de Física, para uso dos estudantes do Ensino Médio. Os futuros professores
foram organizados em duplas e a recomendação inicial foi de construir um jogo de cartas, partindo de um jogo da
memória, visto que tal jogo é o que apresenta elementos básicos e características simples, quando se compara com a
confecção de um jogo, como os de tabuleiro e outros jogos de combinação de cartas.