Instalações elétricas com materiais de baixo custo
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REVISTA DE ENSEÑANZA DE LA FÍSICA, Vol. 33, no. 2 (2021) 414
I. INTRODUÇÃO
Muitas pesquisas interessantes têm sido produzidas na academia nos últimos anos e críticas ao ensino tradicional em
ciências da natureza esbanjam em qualquer programa de pós-graduação da área. Essas críticas, entretanto, parecem
ter uma grande dificuldade em penetrar nos muros da escola (ou, para ser mais preciso, nas portas das salas de aula).
Sugados por uma demanda profissional extenuante e pouco valorizada, os professores de ciências ainda têm dificul-
dade em inovar na sala de aula e fugir do ensino expositivo com foco na memorização de informações abstratas e
descontextualizadas. O resultado, muitas vezes, é que a experiência do aluno na escola acaba se limitando à memori-
zação de nomenclaturas e conceitos científicos e, no caso da física, à prática de exercícios matemáticos desvinculados
da realidade (Delizoicov, Angotti e Pernambuco, 2009).
Para estimular os estudantes a um papel ativo no processo educacional, é preciso, antes de mais nada, que a escola
faça sentido para eles. De fato, o ser humano não é um bom reprodutor de conceitos, mas, sim, reconstrutor (Demo,
2015). Se nos limitarmos a transmitir informações para que os estudantes as reproduzam fielmente nas provas, não
podemos esperar cativar seus interesses. Devemos fornecer a eles formas de interação com os objetos de estudo de
maneira que possam, sozinhos ou em colaboração com seus colegas, construírem seus conhecimentos. Além disso,
não podemos considerar o estudante como uma tábula rasa. Os alunos já possuem conhecimentos prévios em relação
a diversos assuntos abordados em sala de aula, pois eles estão presentes no seu cotidiano, e isso deve ser explorado
pelo professor. Todo conhecimento a ser reconstruído deve começar a partir do que o estudante já conhece, de forma
que ele mesmo conseguirá perceber seu sentido.
No estudo de circuitos elétricos estão presentes diversos conceitos, diagramas e equações, de forma que, muitas
vezes, o professor acredita estar contextualizando o conteúdo simplesmente por citar exemplos de aplicações desses
elementos em aula. No nosso ponto de vista, porém, a simples menção de alguns aspectos da física relacionados ao
cotidiano do aluno não assegura a contextualização do conteúdo de maneira satisfatória. Entendemos que essa con-
textualização ocorre de forma mais efetiva quando o aluno se engaja e assume uma postura ativa em sala de aula.
Acreditamos que a escola deva oportunizar situações nas quais os alunos se envolvam com atividades práticas que
possam ser estendidas para situações do seu dia a dia. Dessa forma, preconizamos ser imprescindível que, no estudo
de circuitos elétricos, o estudante, entre outros aspectos, compreenda o funcionamento de uma instalação elétrica
residencial e de seus componentes, bem como que seja capaz de utilizar esse conhecimento de forma a atuar sobre
ele de maneira segura, seja trocando uma tomada, um interruptor ou um resistor de chuveiro.
Pensando nisso e visando a estimular uma aprendizagem significativa (Ausubel, 2003) e colaborativa, propomos
aqui o desenvolvimento de atividades em grupo nas quais os estudantes realmente coloquem a mão na massa e
aprendam a manipular os objetos que estão presentes no seu dia a dia. Neste artigo, então, apresentamos nossa
experiência ao desenvolver uma unidade de aprendizagem sobre circuitos elétricos que envolvia, entre outras ativi-
dades, a produção de uma maquete residencial e que visava a compreensão dos elementos básicos de instalações
elétricas. Como todas as atividades foram realizadas com materiais de baixo custo e facilmente encontrados no co-
mércio, esperamos que nosso relato possa contribuir para inspirar outros professores a explorarem metodologias
mais ativas e construírem experiências mais significativas para os estudantes em sala de aula.
Além disso, a construção das maquetes residenciais por parte dos alunos também oportuniza o desenvolvimento
de uma cultura maker no contexto educacional. A cultura maker envolve o planejamento e a construção de protótipos
e outros dispositivos, preferencialmente utilizando materiais de baixo custo, fazendo com que os envolvidos coloquem
a mão na massa (Halversin e Sheridan, 2014; Paula, Oliveira e Martins, 2019). No contexto escolar, a educação maker
proporciona que os estudantes sejam protagonistas dos seus aprendizados, uma vez que eles assumem uma postura
ativa. Ademais, ela estimula a criatividade, desenvolve a autonomia, permite a socialização do conhecimento, favore-
cendo o surgimento de atitudes cooperativas (Blikstein, 2013; Peppler e Blender, 2013; Martinez e Stager, 2014).
A experiência que relatamos fez parte de uma pesquisa maior sobre o pluralismo metodológico (Laburú, Arruda e
Nardi, 2003) e a teoria das inteligências múltiplas de Gardner (1993; 2001). Mais detalhes sobre o trabalho e as teorias
que embasaram a proposta podem ser encontrados em Ortiz e Denardin (2019). Desse modo, além de compartilhar
nossa experiência, buscamos discutir os resultados relatados aqui com o intuito de compreender o potencial das ati-
vidades no estímulo às diferentes inteligências e no aumento da motivação e do protagonismo dos estudantes.
Cabe salientar, então, que não entendemos o conceito de inteligência como algo singular e passível de medidas,
como proposto, por exemplo, nos testes de quociente de inteligência (QI). Adotando a concepção proposta por Gar-
dner (2001, p. 46-47), nossa análise considera a inteligência como “um potencial biopsicológico para processar infor-
mações que pode ser ativado num cenário cultural para solucionar problemas ou criar produtos que sejam valorizados
numa cultura”. Nesse sentido, esse potencial pode se expressar de diferentes formas e se configurar em diferentes
tipos de inteligências.
Para os fins de nossa análise neste trabalho, utilizamos três das inteligências propostas pelo autor (espacial, cor-
poral-cinestésica e interpessoal), visto que foram as que emergiram em nossas atividades. A inteligência espacial pode