Ensino de Física inclusivo na UERJ
www.revistas.unc.edu.ar/index.php/revistaEF
REVISTA DE ENSEÑANZA DE LA FÍSICA, Vol. 33, no. 2 (2021) 526
da prática educativa é exatamente o desenvolvimento da curiosidade crítica (Freire, 1996). Desta maneira, criticar-se
sobre a sua prática docente ao longo dos anos faz parte do ato de ser um educador.
Ainda, dos docentes que disseram já ter enfrentado dificuldades ou situações que não souberam lidar todos acre-
ditam que faltou apoio da instituição para encarar o desafio. Como as perguntas eram abertas, onde o sujeito podia
responder como achasse mais conveniente, um docente especificou que as dificuldades enfrentadas foi a falta de
motivação e a infraestrutura deficiente.
Quando perguntados se os docentes já lecionaram para pessoas com deficiência visual, apenas o Docente 3 res-
pondeu de forma negativa. Isso mostra o quão pertinente se torna discutir a formação de tais professores para a
inclusão uma vez que esta já é uma realidade em seu cotidiano. Ao serem questionados se acreditavam que exista
algum conteúdo de Física que seja difícil ou impossível ensinar para um aluno com deficiência visual o primeiro do-
cente diz ser difícil, mas não impossível; D2 acredita não ser impossível, mas matérias ligadas a luz são mais difíceis de
ensinar; o terceiro docente apenas afirmou que sim; D4 disse que não; o último docente afirma que “Não refletiu
muito sobre isso, mas imagina haver dificuldades maiores para disciplinas de laboratório”.
Apenas um professor, que já lecionou para um DV e que possui habilitação em licenciatura e bacharelado, não
acredita que exista um conteúdo de Física que seja difícil ou impossível ensinar para um aluno com deficiência visual.
Esse dado é interessante, pois este docente atua em sala de aula a 14 anos e possivelmente em sua formação inicial
recebeu capacitação para o ensino inclusivo. Como único docente com essa visão sobre o ensino de Física para alunos
com deficiência visual, mostra que a formação inicial de professores pode ter um papel crucial entre as barreiras e as
possibilidades de ensino.
Outrossim, era esperado que os docentes encontrassem barreiras dentro do conteúdo de Física para DV. Eles não
receberam em sua maioria (3 de 5) não são formados, em sua graduação, para lecionar. Assim, é esperado deles que
reproduzam práticas que vivenciaram enquanto discentes e caso não tenham tido contato com outros discentes com
a referida deficiência se torna difícil que estes encontrem facilmente maneiras de ensiná-los.
a capacidade/dificuldade de um aluno cego em aprender física não é intrínseca a este, mas decorre do fato de que o conhe-
cimento científico, enquanto construção social, é comunicado/representado de forma inacessível a este sujeito, ou seja, por
vias predominantemente visuais. (Silva e Camargo, 2018)
Ainda, sobre as dificuldades de ensinar para alunos com deficiência visual, um docente, o D2, diz que “não acredito
que seja impossível, mas matérias ligadas a luz são mais difíceis de ensinar”. Isso mostra que a luz é vista como algo
totalmente visual e por isso seria difícil ensinar “matérias ligadas” a ela. Essa visão de D2 pode ser baseada no fato de
que a educação dos deficientes visuais foi definida pelo padrão adotado pelos videntes. Podemos ressaltar aqui que
a luz ou os conteúdos relacionados a esse conceito podem ser abordados em diversos aspectos.
Eder Pires de Camargo e colaboradores (2008) ao falar sobre as barreiras comunicacionais para o ensino de óptica
para alunos com deficiência visual nos lembre que a luz quando vista do ponto de vista ondulatório faz parte de uma
pequena porção do espectro eletromagnético.
Se tratando do ensino de fenômenos luminosos estes podem ser abordados do ponto de vista histórico e social. A
abordagem de ensino CTS (Ciência, Tecnologia e Sociedade) que possui grande aceitação na atualidade, e com vários
trabalhos acadêmicos publicados, pode ser uma ferramenta útil para os fenômenos indissociáveis de representações
visuais.
Outro ponto importante levantado ainda na discussão sobre as dificuldades no ensino de Física para alunos com
deficiência visual foi a questão experimental. O docente D5 diz que “Não refleti muito sobre isso, mas imagino haver
dificuldades maiores para disciplinas de laboratório”. Duas coisas chamam a atenção em sua resposta. A primeira é o
fato de ele não ter refletido muito sobre o assunto mesmo tendo afirmado que já lecionou para um DV. Esse fato
mostra que o docente não buscou refletir sobre sua prática para com o seu aluno (Schön, 1992). A segunda coisa que
chama atenção, é a preocupação com a experimentação.
O professor é capaz de decidir o que é mais importante em sua disciplina. Por exemplo, quais os objetivos de suas
aulas. Seria correto exigir que um aluno enxergue o espectro visível da luz quando a luz faz parte de um grande espec-
tro eletromagnético onde apenas uma parte de sua faixa é visível? No laboratório, podemos nos perguntar o que
difere a espectroscopia de RAIO X da espectroscopia óptica. Na espectroscopia de Raio X confiamos nos dados que o
aparelho e o computador nos fornecem, pois não temos a capacidade de enxergar o raio X. Contudo, na espectrosco-
pia óptica temos que ver a luz e a partir de suas faixas, a partir do ângulo medido, descobrir os comprimentos de onda.
O que realmente diferencia essas duas experiencias para uma pessoa? Se os dados da espectroscopia óptica forem
fornecidos a uma pessoa DV ela poderá através da teoria e os dados obtidos chegar as mesmas conclusões de videntes.
O que as diferencia em princípio é o instrumento utilizado. Como mostrado em Camargo (2012), Camargo e Nardi
(2007), Camargo e Nardi (2007b), Hallaias; Catarino; Barbosa-Lima (2017). Se o instrumento experimental fosse ade-
quado, a pessoa com deficiência visual superaria sua deficiência.