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VOLUMEN 33, NÚMERO 3 | JULIO-DICIEMBRE 2021 | PP. 51-73

ISSN: 2250-6101



Ensino de ciências por investigação. A viabilidade de sobrevivência humana fora da Terra

Science teaching by investigation: the viability of human survival outside Earth

Danielle Caroline da Silva Chagas1*, Lucas Antonio Caritá2


1Museu Interativo de Ciências - MIC, São José dos Campos, São Paulo, Brasil.


2Grupo de Pesquisa em Matemática Científica e Computacional, Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo – IFSP, São José dos Campos, São Paulo, Brasil.


*E-mail: danielle.silvachagas@gmail.com


Recibido el 19 de abril de 2021 | Aceptado el 9 de noviembre de 2021


Resumo


Este trabalho tem como objetivo avaliar as contribuições do ensino de ciências por investigação na aprendizagem de alunos do ensino fundamental. Utilizamos a metodologia do ensino por investigação para observar o desenvolvimento de algumas habilidades, como: levantamento de hipóteses, análise de dados e conclusões embasadas em dados científicos. Foi elaborada uma sequência de ensino investigativo (SEI), com a temática viabilidade de sobrevivência humana fora da Terra, para ser aplicada durante as aulas de ciências das turmas de 8º ano da escola EMEF Prof.ª Lúcia Pereira Rodrigues. Os resultados apontam que o ensino investigativo possibilita a utilização de conhecimentos prévios na resolução de problemas, bem como favorece o desenvolvimento de habilidades, como: maior autonomia na condução da atividade, abertura para a criatividade, contato com pesquisa científica, relações entre conhecimento científico e sociedade, entre outros.


Palavras chave. Ensino investigativo; Sequência de ensino investigativo; Situações-problemas; Ensino de ciências.


Abstract


This work evaluates the contributions of science teaching by investigation in the learning of elementary school students. We use the methodology of teaching by the investigation to observe the development of some skills, such as: hypothesis survey, data analysis and conclusions based on scientific data. An investigative teaching sequence (SEI) was elaborated, with the theme of human survival feasi-bility outside the Earth, to be applied during the science classes of the 8th year classes of the EMEF Prof.ª Lúcia Pereira Rodrigues school. The results show that investigative teaching enables the use of previous knowledge in problem solving, as well as favors the development of skills such as greater autonomy in conducting the activity, openness to creativity, contact with scientific research, relations between scientific knowledge and society, between others.


Keywords. Investigative teaching; Sequence of investigative teaching; Problem-situations; Science education.


  1. INTRODUÇÃO


    Ainda se encontra nas salas de aula o ensino de ciências realizado de forma tradicional. Este tipo de ensino é centralizado na transmissão do conteúdo pelo professor e na capacidade do aluno de reproduzir o que lhe foi ensinado. Para


    www.revistas.unc.edu.ar/index.php/revistaEF


    Cachapuz, Praia e Jorge (2002), a ciência na perspectiva do ensino tradicional, por ele chamado de ensino por transmissão, é vista somente através dos conhecimentos, cheia de certezas e definida pelo olhar do professor por um realismo ingênuo, passando uma imagem errada da ciência nas aulas.

    Outra visão deformada da ciência, é a de um método científico rígido. Ela é apresentada através de etapas que devem ser seguidas mecanicamente. Ignorando a criatividade, a tentativa ou a dúvida (Gil Pérez, Montoro, Alís, Cachapuz e Praia, 2001).

    Mas não é assim que a ciência se comporta. Os conhecimentos científicos e tecnológicos se modificam de acordo com as necessidades no modo de vida das diferentes sociedades e é construído através de investigações que buscam responder problemas encontrados ao nosso redor.

    Furman (2009) diz que a ciência é como uma moeda: tem duas faces. Em uma delas temos o produto da ciência, que traz o conhecimento já produzido, essencial para entendermos o funcionamento do mundo à nossa volta. E na outra a ciência como processo, que apresenta o método pelo qual o conhecimento é produzido. Sendo assim, é importante um ensino de ciências que se preocupe com estas duas faces e seus encadeamentos, ou seja, esteja voltado não somente para ensinar os conceitos científicos que já existem, mas também a compreender os processos pelo qual eles foram construídos e que suas aplicações geram impacto em nosso cotidiano através de produtos e serviços.

    Cachapuz, Praia e Jorge (2002, p.02) propõem que a Educação em Ciência deixe de ter como objetivo somente a aprendizagem de um corpo de conhecimentos ou de processos da ciência, mas que garanta uma aprendizagem aplicável no cotidiano, não somente de forma instrumental, mas sim em uma perspectiva de ação, contribuindo para o desenvolvimento pessoal e social dos alunos.

    Dentro destas perspectivas, surge o ensino de ciências por investigação, que se baseia na resolução de problemas para o desenvolvimento da aprendizagem. O ensino investigativo tem o aluno como protagonista na construção do conhecimento, pois considera que o mesmo traz consigo conhecimentos prévios que são importantes para a construção de novos. Esta visão da construção do conhecimento já aparece nos trabalhos de Piaget, de onde Carvalho et al. (2018) destacam a importância de um problema para o início da construção do conhecimento e que qualquer novo conhecimento tem origem em um conhecimento anterior.

    Ao propor um problema, espera-se que o aluno busque em seu aporte teórico - seja o que ele já tenha ou o que venha a conhecer – fundamentação para chegar a solução. A resolução de problemas torna possível que o aluno faça levantamento de hipóteses, análise de resultados e conclusões a partir do que foi observado. A investigação permite o desenvolvimento de competências científicas e Furman (2009, p. 12) cita algumas delas como: “observar com um propósito; descrever o que se observa; comparar e classificar com critérios próprios ou dados; [...]”.

    É importante que o ensino de ciências inclua a resolução de problemas através das atividades investigativas. Suart e Marcondes (2008, p. 2) destacam:


    [...] Se o estudante tiver a oportunidade de acompanhar e interpretar as etapas da investigação, ele possivelmente será capaz de elaborar hipóteses, testá-las e discuti-las, aprendendo sobre os fenômenos químicos estudados e os conceitos que os explicam, alcançando os objetivos de uma aula experimental, a qual privilegia o desenvolvimento de habilidades cognitivas e o raciocínio lógico.


    Diferentemente do ensino tradicional, que visa a assimilação de conteúdo, o foco da aprendizagem está no aluno e na ampliação de suas habilidades para perceber e entender o mundo ao seu redor.

    Como o ensino investigativo não propõe etapas rígidas a serem seguidas, mas sim mudanças na estruturação e condução das atividades, Gil Pérez et al. (2001) construíram um quadro de aspectos a serem considerados, que podem contribuir para a construção do conhecimento científico. Um destes aspectos é apresentar situações-problemas abertas que possibilitem a tomada de decisões, e outro é o de levar em consideração o interesse no problema proposto, a fim de dar sentido ao estudo.

    Como um problema proposto no ensino investigativo não está associado a respostas óbvias, é exigido que o aluno seja capaz de utilizar conhecimentos de diversas áreas do saber, abrindo caminho para a transdisciplinaridade. Cachapuz, Praia e Jorge (2002, p. 02) dizem que os problemas mais discutidos em sala de aula derivam de questões mais amplas, com raízes sociais profundas, e completam que:


    [...] Trata-se de envolver cognitiva e afetivamente os alunos, sem respostas prontas e prévias, sem conduções muito marcadas pela mão do professor, caminhando-se para soluções provisórias, como resposta a problemas reais e sentidos como tal, de conteúdo inter e transdisciplinares cultural e educacionalmente relevantes.


    Campos, Fernandes, Ragni e Souza (2012) notaram a importância da resolução de situações-problemas no ensino de física para crianças. Verificaram que ao propor atividades experimentais que tinham como ponto de partida uma situação-problema, em suas interações grupais os alunos eram capazes de argumentar, tomar decisões, descrever


    ações, estabelecer relações entre fatos, e até chegar a conclusões, que são o início da construção do conhecimento científico.

    Lima (2012, p. 33) conclui em seu trabalho que:


    [...] Trabalhar o conteúdo de Genética baseado nas informações reais vinculadas nos meios de comunicação, através de casos de investigação ou de situações cotidianas torna o ensino mais atraente e próximo do aluno, facilitando o entendimento do assunto e colocando os alunos como cidadãos capazes de argumentar e se posicionar diante de assuntos atuais.


    A expectativa não é que os alunos passem a pensar ou agir como cientistas, até porque eles não têm idade e nem conhecimentos suficientes para isto. O que se espera é que com a construção de um ambiente investigativo nas salas de aula, possa-se ensinar dentro do processo do trabalho científico, e com isto eles possam ampliar sua cultura científica (Carvalho et al., 2018).

    A Base Nacional Comum Curricular (BNCC) (2018) entende o processo investigativo como central na formação do estudante, e este deve estar vinculado às atividades didáticas ao longo do ensino básico para que o aluno seja capaz de refletir os seus conhecimentos e sua visão sobre o mundo. Em seu texto introdutório da área de ciências da natureza, a BNCC (2018, p. 319) aborda a formação integral e, para que isto ocorra, é necessário o desenvolvimento do letramento científico, que ela define como:


    [...] letramento científico, que envolve a capacidade de compreender e interpretar o mundo (natural, social e tecnológico), mas também de transformá-lo com base nos aportes teóricos e processuais das ciências.


    Dada a importância de um ensino que contribua para esta formação integral do aluno, percebe-se a necessidade de mudança na didática praticada nas escolas. O presente trabalho tem como objetivo geral avaliar contribuições do ensino de ciências por investigação na aprendizagem de alunos do ensino fundamental. Para isto foram determinados os seguintes objetivos específicos: identificar conhecimento teórico para o planejamento de atividades investigativas; desenvolver e aplicar uma atividade investigativa com a temática viabilidade da sobrevivência humana fora da Terra e identificar o conhecimento construído através do ensino de ciências por investigação.

    Analisaremos se através da atividade investigativa proposta, o aluno consegue utilizar seus conhecimentos prévios para desenvolver conhecimentos novos a partir da resolução dos problemas apresentados.


  2. METODOLOGIA


    Este trabalho foi realizado no segundo semestre de 2019, nas aulas de ciências, com três turmas do 8º ano do ensino fundamental, da escola EMEF Prof.ª Lúcia Pereira Rodrigues em São José dos Campos SP. Por meio de uma Sequência de Ensino Investigativo (SEI) (Carvalho et al., 2018), preparamos atividades a fim de observar o desenvolvimento de habilidades como: levantamento de hipóteses, análise de dados e conclusões embasadas em dados científicos. Para aplicação desenvolvemos formulários analisados de forma quali-quantitativa.

    Uma SEI é constituída das seguintes etapas:


    • Problema: irá introduzir o tópico trabalhado, oferecendo condições para que reflitam sobre os diferentes resultados a serem obtidos.

    • Sistematização: momento de sistematizar o conceito ou conhecimento, objetivo do problema.

    • Contextualização: aprofundamento do conhecimento e sua aplicação do ponto de vista social.

    • Atividade de avaliação: além de avaliar os conceitos aprendidos, também é importante as ações e processos da ciência e as atitudes exibidas durante as atividades.


      Para a construção da SEI aplicada neste trabalho, foi escolhida a seguinte habilidade da área de Ciências da Natureza da BNCC, prevista em seu eixo temático Terra e Universo (2018, p. 349):


      (EF09CI16). Selecionar argumentos sobre a viabilidade da sobrevivência humana fora da Terra, com base nas condições necessárias à vida, nas características dos planetas e nas distâncias e nos tempos envolvidos em viagens interplanetárias e interestelares.


      Sendo assim, a sequência aplicada foi estruturada em dois tópicos:


      Problema.

      1. Escolha do destino, em zona habitável:

        Os alunos deveriam escolher um destino no nosso Sistema Solar para uma nova colonização, levando em consideração as condições necessárias para a sobrevivência humana. O seguinte problema foi proposto:

        Os problemas ambientais na Terra se agravaram, prejudicando as condições para a sobrevivência de vida humana, precisamos encontrar um novo local para habitar. Para onde podemos ir em nosso Sistema Solar?

        Para a resolução foram disponibilizadas fichas com os principais dados dos astros do Sistema Solar (pode-se conferir tais fichas em Chagas (2020)).

      2. Solucionar a questão dos recursos para colonização:

      Com o destino escolhido, os alunos deveriam solucionar os desafios para a colonização. O seguinte problema foi proposto:

      Uma agência X pretende levar uma pequena tripulação ao novo local a ser habitado, para iniciar uma colonização.

      O que precisamos desenvolver (em termos de tecnologia) para viabilizar isso?

      Sistematização: foi realizada uma discussão a partir dos diferentes resultados obtidos e apresentados os conceitos de zona habitável e de elementos essenciais para a vida humana, bem como pesquisas sobre a colonização fora da Terra.

      Contextualização: Os alunos precisavam pensar nas necessidades para manter a vida humana, e que é preciso algumas estruturas para fornecê-las como, por exemplo, supermercados, hospitais, distribuidores de água, etc. Após levantar as estruturas importantes para a manutenção da sociedade, os alunos construíram um mapa com a organização da colonização fora da Terra.

      Atividade de avaliação. Através dos três formulários preenchidos durante as atividades, por observação das atitudes apresentadas e pela produção do mapa da colonização.

      Todo o processo seguiu as etapas ilustradas no diagrama da Figura 1.



      FIGURA 1. Sequência da aplicação das atividades.


      Os formulários foram organizados da seguinte forma (pode-se encontrá-los em Chagas (2020)):


    • Atividade diagnóstica: continha os dois desafios propostos. Para identificar o conhecimento construído através da resolução dos problemas, este formulário foi aplicado antes do início da sequência e reaplicado ao fim dela, para verificar as mudanças produzidas no processo de aprendizagem.


    • Problema 01. continha o primeiro problema a ser solucionado - escolha de um local. Deveria ser preenchido com base nas informações das fichas sobre os astros do Sistema Solar e em pesquisas feitas pelos alunos.

    • Problema 02. incluía o segundo problema a ser solucionado – recursos para a colonização. Foi organizado em quadros para colocar o desafio, a sua solução e a fonte de pesquisa. Os desafios foram elencados pelos próprios alunos.


      Os alunos foram divididos em grupos com até quatro, porém alguns preferiram realizar a atividade individualmente. Foram necessárias duas aulas para a aplicação da atividade diagnóstica, uma no início da sequência e outra no fim. Seis aulas na sala de informática para realização de pesquisas para os problemas propostos. Duas aulas em sala de aula para a discussão e estudo sobre zona habitável e itens essenciais para a vida humana. Para finalizar, quatro aulas em sala de aula para a construção do mapa de colonização.


  3. RESULTADOS E DISCUSSÔES


    1. Aplicação das atividades


      Como o objetivo da atividade diagnóstica era o conhecimento prévio, os alunos foram orientados a realizá-la individualmente e sem consulta. A atividade do Problema 1 foi realizada no laboratório de informática. Além do computador, disponibilizamos fichas com dados dos astros do Sistema Solar para que escolhessem o local embasado em dados. Como foi percebida a dificuldade em encontrar dados confiáveis na internet, disponibilizou-se uma lista de sites, todos com o Selo de Qualidade da Sociedade Astronômica Brasileira1. Foram discutidas as escolhas e, a partir do que eles levaram, lhes foi apresentado o conceito de zona habitável, utilizando uma imagem que mostra a zona de habitabili-dade do Sistema Solar e em outras estrelas com massas diferentes, retirado do site do Instituto de Física UFRGS2.

      No Problema 2, alguns grupos esqueceram alguns elementos essenciais para a vida, como, por exemplo, a água, sendo necessária a intervenção do professor. Conforme pensavam no que era essencial para uma colonização, tal como alimentos, temperatura, água na forma líquida, proteção a radiação e etc., percebiam que o nosso planeta fornece todos os recursos naturais para a manutenção da vida e que é importante preservá-lo. Discutimos os desafios elencados para viabilizar a nova colonização e a partir disso fizemos a relação com os elementos essenciais para a sobrevivência.

      Na construção dos mapas de colonização discussões apareceram, como “qual seria a moeda utilizada nesta nova colonização?”; “se um país chegar primeiro neste local deixaria pessoas de outra nacionalidade irem também?”; “como seria a distribuição de bens e serviços?”; “as pessoas receberiam os produtos de forma igualitária ou seriam comercializados?”; “a competitividade comercial impactaria o meio ambiente assim como acontece aqui?”. Percebemos a transdisciplinaridade que a SEI proporcionou, pois no momento de resolução eram necessários conhecimentos de diversas áreas da Ciência, como Física, Astronomia, Química e Biologia, trazendo também reflexões sobre questões sociais que abarcam áreas como Filosofia, Sociologia, Economia e etc. Compreender as relações entre ciência, tecnologia e a sociedade é importante para que os alunos vejam a ciência mais próxima de sua realidade, e isto contribui para o interesse em assuntos relacionados com ciência e na mudança da imagem de como a ciência é construída, além de torná-los mais conscientes de sua função na sociedade e incentivá-los a agir de forma crítica em relação aos problemas sociais e ambientais atuais (Oliveira, 2010).

      Foi possível observar a aproximação dos alunos com os conhecimentos científicos da astronomia, pois, a partir das atividades, eles entraram em contato com dados, conceitos, notícias, pesquisas e vídeos sobre o tema proposto, e conseguiram utilizar estas informações para a resolução dos problemas. Estas observações vão de encontro com o que Lima (2012, p. 09) em seu trabalho defende que:


      [..] as instituições de ensino devem servir para que estes se formem cidadãos aptos ao entendimento do mundo ao seu redor, capazes de compreender as notícias, discuti-las e argumentar suas posições. Capazes também de fazerem escolhas baseadas em seus conhecimentos, saber analisar aquilo que é melhor para si, para comunidade e para o planeta.


      1. Sociedade Astronômica Brasileira – SAB, 2019. Selo de qualidade SAB. Disponível em: https://sab-astro.org.br/astronomo-cidadao/selo-de-quali-dade-sab/. Acesso em: 14 ago. 2019.

      2. Instituto de Física da UFRGS, 2019. Procura de vida fora da Terra. Disponível em: http://www.if.ufrgs.br/fis02001/aulas/vida_ET/vet.htm. Acesso em: 14 ago. 2019.


    2. Análise dos formulários


      Apresenta-se, nesta seção, os resultados da primeira atividade diagnóstica, do primeiro desafio, do segundo desafio e da segunda atividade diagnóstica. Os formulários foram avaliados por agrupamento de respostas e separados por turma.


      1. Atividade diagnóstica


        No formulário da atividade diagnóstica constavam os dois desafios que seriam trabalhados durante a SEI. O preenchimento deste formulário ocorreu sem nenhuma pesquisa prévia.

        Do total de 100 alunos das três turmas, 84 realizaram a atividade diagnóstica (27 do 8ºA, 30 do 8ºB e 27 do 8ºC).

        As Figuras 2, 3 e 4 expõem os resultados do desafio 01. escolha do local.


        FIGURA 2. Desafio 01 - Escolha do Local (8ºA).


        FIGURA 3. Desafio 01 - Escolha do Local (8ºB).


        FIGURA 4. Desafio 01 - Escolha do Local (8ºC).


        Nas três turmas, o planeta Marte foi o mais escolhido para a nova colonização. Para justificar tal escolha, eles utilizaram os argumentos expostos nas Tabelas I, II e III, onde os números são referentes a quantidade de vezes que a justificativa foi utilizada.


        TABELA I. Justificativas para Marte (8ºA).


        Justificativas

        I - Características parecidas com à da Terra

        2

        II - Encontrar um extraterrestre

        1

        III - Gravidade semelhante à da Terra

        2

        IV - Mais próximo da Terra

        2

        V - Existem pesquisas sendo feitas sobre o local

        5

        VI - Possibilidade de cultivar plantas

        4

        VII - Possibilidade de encontrar vida

        4

        VIII - Possibilidade de mudar a atmosfera composta de CO2

        1

        IX - Presença de água

        6

        X - Presença de oxigênio

        2

        XI - Temperatura semelhante à da Terra

        1


        TABELA II. Justificativas para Marte (8ºB).


        Justificativas

        I - Características mais próximas à da Terra

        4

        II - Existem pesquisas sendo feitas sobre o local

        3

        III - Gravidade semelhante à da Terra

        1

        IV - Já existe projeto de colonização

        4

        V - Local com maiores chances de sobreviver

        1

        VI - Mais próximo da Terra

        1

        VII - Porque a rotação é igual à da Terra

        3

        VIII - Possibilidade de cultivar plantas

        5

        IX - Possibilidade de encontrar vida

        1

        X - Possibilidade de mudar a atmosfera composta de CO2

        1

        XI - Presença de água

        15

        XII - Presença de oxigênio

        2

        XIII - Temperatura semelhante à da Terra

        3


        TABELA III. Justificativas para Marte (8ºC).


        Justificativas

        I - Atmosfera parecida com a da Terra

        1

        II - Características semelhantes à da Terra

        2

        III - Existem pesquisas sendo feitas sobre o local

        7

        IV - Gravidade semelhante à da Terra

        1

        V - Mais próximo da Terra

        4

        VI - Mais próximo da zona habitável

        1

        VII - Mais próximo do Sol

        2

        VIII - Possibilidade de cultivar plantas

        1

        IX - Possibilidade de encontrar vida

        2

        X - Possibilidade de mudar a atmosfera composta de CO2

        2

        XI - Presença de água

        7

        XII - Temperatura semelhante à da Terra

        3


        As justificativas para a escolha de outros locais estão nas Figuras 5 e 6, e estão agrupadas com o número de vezes que cada uma delas apareceram nas três turmas. Os números nas figuras são referentes a quantidade de vezes que a justificativa foi utilizada.




        FIGURA 5. Justificativas para outros locais.




        FIGURA 6. Justificativas para outros locais.


        Os resultados do desafio 02, o qual solicitava os itens necessários para viabilizar a nova colonização, estão nas Figuras 7, 8 e 9, onde os números são referentes a quantidade de vezes que os itens apareceram nos formulários.




        FIGURA 7. Itens necessários para viabilizar a nova colonização (8ºA).




        FIGURA 8. Itens necessários para viabilizar a nova colonização (8ºB).



        FIGURA 9. Itens necessários para viabilizar a nova colonização (8ºC).


        Constatamos que os alunos demonstraram conhecimento prévio sobre o assunto, mesmo que alguns equivocados. Isto fica claro, pois em sua maioria escolheram Marte como novo local, utilizando como justificativa a presença de água. Alguns alunos citam que existem pesquisas sendo feitas sobre o planeta. Este conhecimento se deve ao fato de as pesquisas relacionadas a Marte serem muito noticiadas. Uma simples busca no Google fornece informações sobre o assunto em sites como da BBC News3, G14, Uol5 e etc. Borges (2002, p. 21) aborda a influência dos conhecimentos vindos do cotidiano dos alunos na aprendizagem:


        […] as crianças trazem para a escola um conjunto de concepções sobre vários aspectos do mundo, mesmo antes de qualquer introdução à ciência escolar. Essas concepções alternativas são adquiridas a partir de sua inserção na cultura comum e da experiência cotidiana com fenômenos e eventos, e, frequentemente interferem com a aprendizagem das ideias científicas.


        Desta forma percebemos que eles têm acesso às informações do meio científico, como nos mostra as justificativas de dois alunos relatadas abaixo. Na identificação dos alunos, a numeração é referente ao seu número na lista de frequência da sala e a letra à sua turma.




        3 Veiga, Edison. Cientistas encontram água líquida em Marte, descoberta que pode transformar busca por vida. BBC News Brasil, Milão, 25 de jul. de 2018. Disponível em: https://www.bbc.com/portuguese/geral-44946892. Acesso em: 20 de out. de 2020.

        1. Sonda da agência espacial europeia indica novos reservatórios de água em marte. G1, São Paulo, 29 de set. de 2020. Disponível:

          <https://g1.globo.com/ciencia-e-saude/noticia/2020/09/29/sonda-da-agencia-espacial-europeia-indica-novos-reservatorios-de-agua-em-marte.ghtml>. Acesso em: 20 de out. de 2020.

        2. Cientistas encontram novos reservatórios de água em Marte. Uol Notícias – Cotidiano, São Paulo, 30 de set. de 2020. Disponível em: <https://no-ticias.uol.com.br/ultimas-noticias/agencia-estado/2020/09/30/cientistas-encontram-novos-reservatorios-de-agua-em-marte.htm>. Acesso em: 20 de out. de 2020.


        Marte ou planeta vermelho como é popularmente conhecido, é o planeta mais próximo de nós, o que facilitaria nossa viagem, além de possuir uma gravidade não tão alta que facilitaria a locomoção pelo planeta. Marte possui também uma atmosfera composta por basicamente CO2 (95%), mas existe algumas possibilidades de mudarmos essa situação. (Aluna 09ª)


        Porque no filme que eu assisti havia um pouco de oxigênio lá [...] (Aluno 01ª)


        Ambos escolheram Marte como o local mais apropriado. Observando as justificativas, percebemos que a aluna 09A utiliza conceitos e dados para embasar sua escolha, enquanto o aluno 01A chegou a sua resposta através de um filme. O conhecimento de cada um tem relação com as informações ofertadas em seus cotidianos. Mesmo que uma justificativa seja mais simples que a outra, e que a afirmação do aluno 01A não esteja correta, pois não há indícios da existência de oxigênio na atmosfera de Marte suficiente para suportar a vida humana, cada aluno utiliza seus conhecimentos como recurso para descobrir e aprender novos. Conforme se tem acesso aos conhecimentos científicos, os alunos podem confirmar ou descartar as hipóteses que levantaram a princípio, podendo chegar a respostas diferentes das iniciais.

        O ensino investigativo pontua a importância de considerar os conhecimentos prévios, pois eles são utilizados na construção dos novos. Portanto, para que a aprendizagem ocorra, não se deve propor qualquer problema, e sim um que “deve estar dentro de sua cultura, sendo interessante para eles de tal modo que se envolvam na busca de uma solução e na busca desta solução deve-se permitir que exponham seus conhecimentos espontâneos sobre o assunto” (Carvalho et. al., 2018, p. 06).


      2. Problema 01 – Escolha do local


        Os alunos foram divididos em grupos de até 4 estudantes, mas alguns preferiram realizá-la individualmente. Do total de 100 alunos das três turmas, 86 participaram desta atividade (29 do 8ºA, 27 do 8ºB e 30 do 8ºC). Para fazer a atividade, discutiram e debateram os dados até chegarem às suas conclusões, pesquisando nos laboratórios de informática da escola e nas fichas de apoio, que o leitor pode encontrar em Chagas (2020). Os resultados obtidos constam na Figura 10.



        FIGURA 10. Problema 01 - Escolha do Local.


        As Tabelas IV, V e VI expõem as justificativas utilizadas em suas escolhas, onde os números são referentes a quantidade de vezes que a justificativa foi utilizada.


        TABELA IV. Justificativas para o local escolhido (8ºA).


        Justificativas para Marte

        I - Características do solo

        5

        II - Dados da composição da atmosfera

        3

        III - Distância do Sol

        3

        IV - Gravidade

        2

        V - Não se baseou em dados

        2

        VI - Presença de água congelada

        4

        VII - Temperatura

        6


        TABELA V. Justificativas para o local escolhido (8ºB).


        Justificativas para Marte

        I - Características do solo

        1

        II - Dados da composição da atmosfera

        7

        III - Distância do Sol

        2

        IV - Gravidade

        5

        V - Não se baseou em dados

        1

        VI - Presença de água congelada

        8

        VII - Temperatura

        9


        Na Tabela V não consta justificativas para a Lua, pois o grupo não justificou sua resposta.


        TABELA VI. Justificativas para o local escolhido (8ºC).


        Justificativas


        Marte

        I - Características do solo

        2

        II - Dados da composição da atmosfera

        4

        III - Distância do Sol

        1

        IV - Gravidade

        1

        V - Não se baseou em dados

        1

        VI - Presença de água congelada

        4

        VII - Temperatura

        4


        Lua

        I - Presença de água

        1

        II - Temperatura

        1


        Europa (Júpiter)

        I - Composição

        1

        II - Presença de água

        1


        Percebemos que lugares inviáveis para a sobrevivência humana, como Sol, Saturno, Vênus e etc., foram descartados, mostrando que os alunos foram capazes de escolher através dos dados de suas pesquisas. Destacamos que o objetivo não era que todos chegassem à mesma conclusão, e sim que analisassem os dados, os comparassem e chegassem a uma solução. Borges (2002, p. 21) defende que este é o intuito do problema no ensino investigativo:


        [...] Um problema, diferentemente de um exercício experimental ou de um de fim de capítulo do livro-texto, é uma situação para a qual não há uma solução imediata obtida pela aplicação de uma fórmula ou algoritmo. Pode não existir uma solução conhecida por estudantes e professores ou até ocorrer que nenhuma solução exata seja possível. Para resolvê-lo, tem-se que fazer idealizações e aproximações. [...]


        Um dos locais escolhido foi Europa, satélite de Júpiter, que não constava nas fichas de apoio disponibilizadas, demonstrando que o caráter mais aberto do ensino investigativo possibilita maior autonomia dos alunos para intervir na atividade (Oliveira, 2010).

        Nesta atividade, as justificativas já eram pautadas em dados sobre as características do local, como mostra os relatos selecionados a seguir. Na identificação dos grupos a numeração é referente ao número atribuído a cada grupo e a letra a sua respectiva turma.


        Sabemos que há água congelada, então dependemos da tecnologia basicamente para sobreviver. (Grupo 11B)


        Por mais que sua composição atmosférica seja composta de 95,97% de gás carbônico, impossibilitando nossa respiração, poderíamos levar equipamentos contendo gás oxigênio para sobreviver. (Grupo 09B)


        As temperaturas são baixas (-55°C), mas se considerarmos as temperaturas já registradas na Terra, o frio é suportável.

        (Grupo 04ª)


        Os grupos 09B e 04A além de expor os dados, os relacionou com fenômenos observáveis, como impossibilidade de respirar por conta da composição da atmosfera. Oliveira (2010, p. 144) diz que, ao contrário das atividades tradicionais, os experimentos possibilitam “a capacidade de elaborar explicações coerentes para os dados obtidos à luz do conhecimento científico”.


        Mas também temos grupos que não justificaram suas escolhas ou que a justificativa não era coerente, como observamos no relato a seguir, utilizado para fundamentar a Lua como o local mais apropriado.


        Tem uma temperatura que atinge 120°C durante o dia lunar e -150°C durante a noite lunar. [...] Acredita-se que em sua superfície não há existência de água, mas algumas pesquisas contradizem isso. (Grupo 03C)


        Essa justificativa não implica na Lua como um lugar adequado para a sobrevivência humana, seja pelas temperaturas ou pela ausência de água. É nítido que os alunos deste grupo não conseguiram dispor dos dados disponibilizados para embasar corretamente sua escolha. A finalidade no ensino investigativo não é que o erro não ocorra, mas que, quando ele aparecer os alunos sejam capazes de também usá-los no processo para solucionar o problema. O erro é uma ocorrência importante, porque a partir dele pode-se levantar novas hipóteses que poderão levar a um resultado melhor.

        Em sala de aula, se deixarmos os erros de fora, não somente distanciamos os alunos da realidade do meio científico, como também teremos aulas práticas com o objetivo de meramente reproduzir um determinado experimento, sem reflexões. Não basta deixar que os alunos errem e aprendam sozinhos com seus próprios erros, para que a aprendizagem ocorra “o professor atua como um mediador entre o grupo e a tarefa, intervindo nos momentos em que há indecisão, falta de clareza ou consenso” (Borges, 2002, p. 25).

        Porém, em turmas com grande número de alunos, o professor pode encontrar dificuldades em sua atuação como mediador. Esta dificuldade ocorreu em determinados momentos da aplicação deste trabalho. No relato do grupo 03C, percebemos que não houve a intervenção do professor capaz de colocá-los em uma situação de conflito de ideias e lhes dado novos conhecimentos, criando condições para que os alunos compreendessem o erro por si só, ou até mesmo que o professor corrigisse alguns conhecimentos equivocados (Oliveira, 2010).

        As atividades investigativas demandam um maior esforço em sua preparação e aplicação para criar condições para o desenvolvimento do aluno e diminuir situações semelhantes à que foi apresentada. Para um melhor preparo do professor, Borges (2002, p.25) defende que “essas abordagens deveriam ser adotadas na formação de professores. Os licenciandos precisam exercitar o planejamento, a preparação e a execução de atividades mais abertas, se desejamos que eles venham a adotá-las em suas aulas no futuro”.


      3. Problema 02 – Itens essenciais para a nova colonização


        Foram mantidos os grupos do Problema 01. Os alunos realizaram pesquisas e discutiram os dados para chegarem em suas conclusões. Os grupos das três turmas elencaram um total de 14 itens diferentes necessários para viabilizar a nova colonização. A descrição dos itens e a quantidade de vezes que cada um aparece nos formulários estão nas Figuras 11, 12 e 13, onde os números são referentes a quantidade de vezes que os itens apareceram nos formulários.




        FIGURA 11. Itens necessários (8ºA).




        FIGURA 12. Itens necessários (8ºB).



        FIGURA 13. Itens necessários (8ºC).


        Os itens mais mencionados foram água, alimentação e oxigênio, provavelmente por serem necessidades primárias. Alguns grupos foram além e elencaram transporte, temperatura, moradia, comunicação e etc. Ao propor um problema aberto conseguimos estimular a criatividade estimulando o levantamento de hipóteses para a solução do problema.

        Ao abordar problemas do cotidiano, permitimos que reflitam os processos da ciência e da tecnologia (Cachapuz, Praia e Jorge, 2002). O Problema 02 possibilitou maior contato com pesquisas relacionadas a descobertas científicas e desenvolvimento de tecnologias. Para ilustrar este apontamento segue o relato de um dos grupos sobre a solução para a temperatura em Marte:


        O plano é liberar o gás carbônico preso sobretudo nas calotas polares sob a forma de gelo seco. Com a liberação do gás carbônico, não só a atmosfera aumenta de densidade (pressão) como também dispara o processo de aquecimento global através do efeito estufa. O gás carbônico é um ótimo gás do efeito estufa, ou seja, ele tem uma boa capacidade de reter o calor, assim como o vapor d’água e o gás metano. (Grupo 05ª)


        Cachapuz, Praia e Jorge (2002, p. 03), complementam que os problemas devem “refletir sobre os processos da ciência e da tecnologia bem como as suas inter-relações com a sociedade e ambiente”. Desta forma, o Problema 02 requisitava dos alunos que refletissem sobre os efeitos das novas pesquisas científicas gerados na sociedade e meio ambiente. Como exemplo, temos grupos que em seus desafios se propuseram a pensar sobre o descarte adequado dos resíduos gerados, como consta na Figura 12, demonstrando o potencial desta atividade para ser utilizada em uma abordagem transdisciplinar mais aprofundada sobre o impacto das civilizações humanas no meio ambiente onde estão inseridas.




        FIGURA 14. Erros nos Problemas 01 e 02.


        Na Figura 14 exibimos um comparativo dos erros encontrados nos Problemas 01 e 02. No Problema 02, alguns exemplos desses erros seriam dados equivocados e soluções inviáveis, além da falta das fontes de pesquisa, uma das exigências da atividade. Podemos verificar que há um aumento na incidência de erros no Problema 02, em relação ao Problema 01. Este fato se dá, pois os desafios propostos não se caracterizam da mesma forma. No ensino investigativo os problemas propostos podem ser expostos em níveis diferentes que Borges (2002, p. 22) descreve como fechado e aberto da seguinte forma:


        [...] no primeiro caso, o problema, os procedimentos e recursos são dados pelo professor, livro ou roteiro, ficando para o aluno a tarefa de colher dados e tirar as conclusões. Ao contrário, em uma investigação aberta, cabe a ele toda a solução, desde a percepção e geração do problema; sua formulação em uma forma suscetível de investigação; o planejamento do curso de suas ações; a escolha dos procedimentos, a seleção dos equipamentos e materiais, a preparação da montagem experimental, a realização de medidas e observações necessárias; o registro dos dados em tabelas e gráficos; a interpretação dos resultados e enumeração das conclusões. [...]


        Seguindo esta classificação, o Problema 01 expressou-se de maneira fechada, pois além de fornecer o problema, também fornecia dados a serem utilizados através das fichas de apoio, deixando ao aluno a análise dos dados e conclusão da melhor solução, com poucas intervenções. Já o Problema 02 propunha somente uma situação, exigindo que os alunos indicassem os possíveis problemas que uma nova civilização enfrentaria, buscassem as informações, analisassem os dados e chegassem a melhor solução, necessitando então maior autonomia.

        Borges (2002, p. 24) ainda sugere que:


        [...] uma atividade aberta pode ser muito difícil para alunos sem conhecimento de conteúdo e sem experiência anterior em laboratório. No entanto, temos evidências de que, mesmo sem conhecimento específico sofisticado e experiência com aulas de laboratório, conseguem formular problemas mais simples e planejar a sua solução em laboratório.


        A falta de experiência com atividades investigativas mais amplas dificulta a sua realização. Para que os alunos obtenham maior êxito é necessário maior contato com estas atividades, introduzindo-as desde os níveis mais fechados até os mais abertos durante todo o ensino básico.


      4. Atividade diagnóstica


        Ao final reaplicamos o formulário da atividade diagnóstica, a fim de comparar os resultados obtidos antes da SEI e após a sua aplicação. A Figura 19 exibe um comparativo do número de alunos que realizaram as duas atividades.



        FIGURA 19. Alunos que realizaram as atividades diagnósticas.


        O número de alunos que realizaram a segunda atividade diagnóstica diminuiu, talvez porque estes alunos não estavam acostumados com atividades investigativas que demandam tanta autonomia. Outro fator é que esta atividade em particular demandava muita pesquisa e registro dos resultados, o que causava certo incômodo em alguns alunos.

        Comparamos os formulários dos alunos que realizaram as duas atividades, que somam 54 alunos (13 do 8ºA, 21 do 8ºB e 20 do 8ºC). Ao analisar o Desafio 01, construímos um gráfico comparativo referente a escolha do local feita pelos alunos, como consta nas Figuras 20, 21 e 22.



        FIGURA 20. Desafio 01 (8ºA).



        FIGURA 21. Desafio 01 (8ºB).



        FIGURA 22. Desafio 01 (8ºC).


        O planeta Marte passou a ser escolhido por todos os alunos do 8ºA e 8ºB e no 8ºC, além de a maioria também escolher este planeta, surgiu um local novo – Europa (Júpiter). As possibilidades inviáveis – como Sol, Júpiter e Saturno

        – não aparecem mais.

        Analisamos agora as justificativas utilizadas para a escolha do local na segunda atividade diagnóstica, nas Tabelas VII, VIII e IX. Os números são referentes a quantidade de vezes que a justificativa foi utilizada.


        TABELA VII. Justificativas para o local escolhido (8ºA).


        Justificativas para Marte

        I - Contém água congelada

        5

        II - Contém um pouco de oxigênio

        2

        III - Distância da Terra

        2

        IV - É um planeta rochoso

        2

        IX - Aumento da temperatura com intensificação do efeito estufa, liberando CO2

        2

        V - Está na Zona Habitável

        1

        VI - Gravidade parecida com a da Terra

        1

        VII - Melhor candidato apesar das baixas temperaturas

        2

        VIII - Pesquisas podem solucionar problemas com falta de oxigênio

        2

        X - Possibilidade de construir casa, levar comida, água, etc.

        1

        XI - Semelhante a Terra

        3

        XII- Temperaturas parecidas com a Terra

        2


        TABELA VIII. Justificativas para o local escolhido (8ºB).


        Justificativas para Marte

        I - Atmosfera semelhante à da Terra

        1

        II - Características mais próximas as da Terra

        3

        III - É um planeta rochoso

        5

        IV - Está na zona habitável

        3

        V - Menor distância da Terra

        2

        VI - Menor distância do Sol

        4

        VII - Pesquisas já resolveram problemas com baixas temperaturas

        2

        VIII - Pesquisas podem solucionar os problemas encontrados

        1

        IX - Possibilidade de encontrar vida

        1

        X - Possibilidade de cultivar plantas

        1

        XI - Presença de água congelada

        12

        XII - Solo adequado para plantação

        1


        TABELA IX. Justificativas para o local escolhido (8ºC).


        Justificativas


        Marte

        I - Aumento da temperatura com intensificação do efeito estufa, liberando gás carbônico

        1

        II - Dá para deixar Marte parecido com a Terra

        2

        III - Descobriu que existem provisões para viver em Marte

        1

        IV - Está na zona habitável

        8

        V - Existem pesquisas sendo feitas sobre o local

        1

        VI - Menor distância da Terra

        4

        VII - Menor distância do Sol

        7

        VIII - Mudança da atmosfera para ter oxigênio

        3

        IX - Possibilidade de encontrar vida

        1

        X - Presença de água congelada

        12

        XI - Temperatura semelhante à da Terra

        3

        Europa (Júpiter)

        I - Presença de oxigênio

        1


        Há mudança nas justificativas utilizadas, pois neste momento os alunos usufruíram dos dados que obtiveram durante a pesquisa, como por exemplo a presença de água congelada em Marte. Sasseron e Carvalho (2011, p. 75), em um de seus eixos estruturantes para a alfabetização científica, dizem que é necessário:


        [...] compreensão básica de termos, conhecimentos e conceitos científicos fundamentais e concerne na possibilidade de trabalhar com os alunos a construção de conhecimentos científicos necessários para que seja possível a eles aplicá-los em situações diversas e de modo apropriado em seu dia-a-dia. [...]


        Também percebemos isto na justificativa: “aumento de temperatura com intensificação do efeito estufa”. Era necessário compreender o fenômeno do efeito estufa e relacioná-lo com os dados sobre a reserva de dióxido de carbono congelado em Marte.

        Houve um aumento no uso do termo zona habitável, conceito novo que foi inserido aos alunos durante a aplicação do Problema 01. Alguns alunos não utilizaram exatamente o termo, mas fizeram a relação entre a distância do Sol e a possibilidade de ter vida ou não no local. Oliveira (2010, p. 144) diz que uma das contribuições das aulas práticas para o ensino de ciências é aprender conceitos científicos: “a atividade experimental também pode – para muitos, deve –ser um espaço para construção de novos conhecimentos”.

        Retomando os eixos estruturantes para a alfabetização científica, propostos por Sasseron e Carvalho (2011, p. 75), destacamos:


        [...] compreensão da natureza das ciências e dos fatores éticos e políticos que circundam sua prática. Reporta-se, pois, à ideia de ciência como um corpo de conhecimentos em constantes transformações por meio de processo de aquisição e análise de dados, síntese e decodificação de resultados que originam os saberes. [...]


        Destacamos as duas justificativas “Pesquisas já resolveram problemas com baixas temperaturas” e “Descobriu que existem provisões para viver em Marte”. Demonstra que a atividade ampliou o contato com as pesquisas científicas sobre o tema e o conhecimento dos alunos.

        Ainda aparecem erros nas respostas como, Marte ter características parecidas com a Terra, conter oxigênio, gravidade parecida com a da Terra e etc. Os erros demonstram que nas atividades em grupo é necessária maior intervenção do professor para garantir participação em todas as etapas da atividade e contato com os novos conhecimentos.

        Os resultados do Desafio 02, constam nas Tabelas X, XI e XII. Os números são referentes a quantidade de vezes que os itens aparecem nos formulários.


        TABELA X. Atividade diagnóstica – Desafio 02 (8ºA).


        Desafio 02

        I - Ajustar os gases da atmosfera

        1

        II - Aumentar as temperaturas

        3

        III- Base na Lua (reduzir gastos com transporte)

        1

        IV - Cabines fechadas para moradia

        3

        IX - Estufa para cultivo

        2

        V - Centro de oxigênio

        2

        VI - Descongelar a água

        5

        VII - Diminuir níveis de CO2 com cianobactérias

        1

        VIII - Equipamento para transformar CO2 em O2

        1

        X - Intensificar o efeito estufa

        3

        XI - Máscaras de oxigênio

        3

        XII - Trajes

        1

        XIII- Transporte

        2


        No primeiro contato com o Desafio 02, os alunos somente elencaram os itens necessários para a nova colonização, como água, oxigênio, alimento e etc. Já neste momento, os mesmos além de elencar os desafios passaram a propor soluções. Como, por exemplo, na proposta de desenvolver equipamentos para descongelar a água ou para transformar CO2 em O2, eles deixam de listar os problemas água e oxigênio, e começam a sugerir as possíveis soluções.


        TABELA XI. Atividade diagnóstica – Desafio 02 (8ºB).


        Desafio 02

        I - Alimentos com nutrientes energéticos, construtores e reguladores

        2

        II - Aumentar atmosfera para proteger dos raios solares

        1

        III - Comunicação

        2

        IV - Divisão dos trabalhos

        1

        IX - Temperatura

        9

        V - Equipamento para derreter a água

        1

        VI - Equipamento para derreter o CO2

        11

        VII - Equipamento que contenha grandes reservas de O2

        9

        VIII - Estufa de cultivo

        4

        X - Trajes com oxigênio

        1

        XI - Trajes para altas e baixas temperaturas

        3

        XII - Transporte

        4


        TABELA XII. Atividade diagnóstica – Desafio 02 (8ºC).


        Desafio 02

        I - Cultivo de alimento

        6

        II - Descongelar a água

        9

        III - Equipamento de oxigênio

        9

        IV - Equipamento de transformar CO2 em O2

        4

        IX - Máquina de tratamento de água

        2

        V - Equipamento para descongelar o CO2

        2

        VI - Estufa para plantio

        1

        VII - Fonte de água

        1

        VIII - Formas de fazer efeito estufa

        4

        X - Moradia

        4

        XI - Placas solares

        1

        XII - Sustentabilidade

        1

        XIII - Tecnologia para aumentar a temperatura

        2

        XIV - Trajes apropriados

        4

        XV - Trajes para controlar temperatura

        1


        Agora aparecem soluções relacionando ciência, tecnologia, sociedade e meio ambiente. Dentro deste contexto, vemos os alunos lembrarem da importância da sustentabilidade, de propor divisão dos trabalhos exercidos e associ-ando o desenvolvimento de tecnologias necessárias para o oferecimento de alguns serviços.

        Sasseron e Carvalho (2011, p. 76) em seu terceiro eixo para o desenvolvimento da alfabetização científica, falam sobre a importância de entender estas relações:


        [...] Trata-se da identificação do entrelaçamento entre estas esferas e, portanto, da consideração de que a solução imediata para um problema em uma destas áreas pode representar, mais tarde, o aparecimento de um outro problema associado. Assim, este eixo denota a necessidade de se compreender as aplicações dos saberes construídos pelas ciências considerando as ações que podem ser desencadeadas pela utilização dos mesmos. O trabalho com este eixo deve ser garantido na escola quando se tem em mente o desejo de um futuro sustentável para a sociedade e o planeta.


        A SEI possibilitou o entendimento destas relações, pois ao proporem as soluções para a nova colonização, os alunos precisavam refletir sobre o desenvolvimento de tecnologias e os impactos que seriam gerados na sociedade e no meio ambiente.

        Desta forma é indicado que seja separado um momento neste tipo de atividade para que haja discussões entre os grupos sobre os dados coletados e as resoluções dos problemas, para que possam tanto analisar as melhores soluções, como também fazer a relação entre tecnologia, sociedade e meio ambiente em suas propostas.


      5. Construção dos mapas da colonização


    Propusemos a confecção de um mapa da nova colonização. Os mapas produzidos podem ser encontrados em Chagas (2020). Esta seção discute alguns dos mapas entregues.

    A maior parte dos grupos preocupou-se com itens essenciais primários, como no Problema 02. Os mapas conti-nham estruturas referentes à alimentação, água, oxigênio e moradia, que seriam os itens básicos para iniciar a nova colonização, como no exemplo da Figura 15, que contém casas, cúpulas de oxigênio, estufa para produção de plantas e oxigênio com base vegetal, represa, base central – controle de temperatura e gravidade, placas solares, aeroporto espacial e indicava a distribuição de energia, água e oxigênio através de linhas de cores diferentes.



    FIGURA 15. Mapa do Grupo 07B.


    No mapa da Figura 16, o grupo, além de identificar o local para a produção de alimentos, também listou quais os alimentos seriam produzidos e a forma de cultivo adotada (rotação de cultura). O grupo também instalou em sua base central um centro de pesquisas, demonstrando que sente a importância das pesquisas científicas. Uma das questões levantadas por muitos grupos é como se daria a distribuição dos recursos, e neste mapa vemos que foi destinado um local para geração de renda e troca de materiais.



    FIGURA 16. Mapa do Grupo 05A.


    Percebemos que era necessário, além dos dados sobre o local, refletir em como eles seriam utilizados na organização da sociedade e que impactos isso geraria no cotidiano. Para que a alfabetização científica ocorra, é preciso que o aluno consiga relacionar ciência, tecnologia e sociedade. Sasseron e Carvalho (2011, p. 16), diz que para iniciar a alfabetização científica:


    [...] é preciso que o ensino não se centre somente na manipulação de materiais para a resolução de problemas associados a fenômenos naturais, mas que privilegie questionamentos e discussões que tragam à pauta as múltiplas e mútuas influências entre o fenômeno em si, seu conhecimento pela comunidade científica, o uso que esta comunidade e a sociedade como um todo fazem do conhecimento, além das implicações que isso representa para a sociedade, o meio-ambiente, o futuro de cada um de nós, de todos e do planeta.


    É notável que os alunos tenham feito estas relações quando vemos suas propostas, como a de instalações de painéis solares, de distribuição de recursos, de divulgação científica, cultivo adequado e etc.

    Determinados grupos relacionaram o que propuseram no Problema 02 com a construção do mapa. Veja a seguir a proposta do grupo 11B para solucionar o problema do oxigênio e veja a estrutura do mapa na Figura 17. Observamos que em seu mapa consta a central de produção de oxigênio e que todas as outras instalações estão ligadas a ela.


    Poderíamos desenvolver uma cápsula para cada pessoa, assim cada uma teria o seu próprio oxigênio. Ou poderíamos ter um lugar no centro do local a ser habitado onde teria uma máquina que produzia oxigênio, que seria encanado até a casa das pessoas. E todas daí “teria” para ir para fora de suas casas com seu cilindro de oxigênio que seria abastecido pela máquina. (Grupo 11B)



    FIGURA 17. Mapa do Grupo 11B.


    QUADRO 1. Legenda Figura 17.


    Legenda – Figura 17

    MR – Education Mars

    MQ – Centro Médico

    MP – LDC (Laboratório de Desenvolvimento Científico)

    MO – Intendência

    MN – Vácuo

    MF – Estufa Hidráulica

    MM – Área restrita (H20)

    ML – Área restrita (radiação) placas solares

    MK – Torre de controle

    MH / MI / MJ / MG – Estufa alimentícia

    01 – Centro de oxigênio


    Outro exemplo é visto no grupo 09B, que implementou em seu mapa (Figura 18) a solução para as baixas temperaturas do planeta.


    [...]há uma grande reserva de CO2 congelado no planeta. Se desenvolvêssemos um grande equipamento que o desconge-lasse, esse gás aumentaria o efeito estufa, e assim, aumentaria a temperatura do planeta, que ficaria propícia para a vida humana. (Grupo 09B)



    FIGURA 18. Mapa do Grupo 09B.


    Os alunos levantaram hipóteses para resolver o problema proposto no Problema 02, e em seguida esquematiza-ram a solução mais adequada no desenho do mapa. As atividades os incentivaram a colocar em prática sua criatividade e utilizá-la à luz dos conhecimentos científicos. Oliveira (2010, p. 05) afirma que “quanto mais os alunos estiverem envolvidos com as múltiplas etapas da atividade experimental, mais terão sua criatividade estimulada”.


  4. CONSIDERAÇÕES FINAIS


Apresentamos um modelo de atividade investigativa para alunos do ensino fundamental, com objetivo de avaliar contribuições do ensino de ciências por investigação na aprendizagem dos estudantes.

Uma série de atividades foi proposta com o tema viabilidade de sobrevivência humana fora da Terra. A sequência era composta por dois problemas: escolha de um local no Sistema Solar para a sobrevivência humana e itens necessários para a nova colonização.

Ao final percebemos que os resultados obtidos vão de encontro com o objetivo expressado no início da pesquisa, pois foi possível observar as contribuições do ensino investigativo na aprendizagem dos alunos, uma vez que ocorreu a construção de novos conhecimentos relacionados à temática proposta na sequência didática. Além do mais, esta abordagem de ensino vai além da aprendizagem de novos conteúdos e possibilita também o desenvolvimento de competências científicas, como por exemplo, propor hipóteses, comparar e classificar, analisar resultados, argumentar com base em evidências e etc. Outras contribuições verificadas nesta pesquisa, foram a maior autonomia dos alunos na condução da atividade, abertura para a criatividade, contato com a pesquisa científica, relações entre conhecimento científico e sociedade, entre outros.

Desta forma, observando as contribuições levantadas neste trabalho, percebe-se que o ensino investigativo oferta possibilidades do desenvolvimento da alfabetização científica, prevista no ensino de Ciências Naturais da BNCC, pois viabiliza uma formação integral do aluno. Outro ponto relevante é o fato de a atividade proposta não ser um experimento prático, demonstrando que a investigação pode ser feita mesmo sem um laboratório com equipamentos sofisticados, visto que ainda se faz necessário quebrar o paradigma de que o ensino investigativo só ocorre com experimentos em laboratório. Esta pesquisa, portanto, abre espaço para o desenvolvimento e difusão de atividades investigativas que demandem poucos recursos ou recursos adaptáveis, para que o ensino de ciências por investigação possa ser aplicado com maior frequência em salas de aula.

Novas práticas como essas se fazem necessárias para um ensino de ciências capaz de desenvolver um aluno apto a compreender os produtos e processos da ciência e seus impactos na sociedade e meio ambiente, sendo este trabalho mais uma contribuição neste sentido.


REFERÊNCIAS


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